O pregador da Casa Pontifícia
trouxe para a homilia desta Sexta-feira Santa (7), na Basílica de São Pedro, em
celebração presidida pelo Papa, a reflexão sobre a existência de uma narrativa
diversa para a morte de Deus, "ideológica, não histórica", proclamada
pelo anúncio que Nietzsche põe na boca do "homem louco". Como
crentes, convida Raniero Cantalamessa, "é nosso dever mostrar o que está
por trás ou sob aquele anúncio".
Andressa
Collet - Vatican News
No dia em
que os fiéis são convidados a fixar o olhar em Jesus Crucificado, que carregou
na cruz os pecados de toda a humanidade para salvá-la, o Papa Francisco
presidiu a Liturgia da Palavra na Basílica de São Pedro. Na homilia desta
Sexta-feira Santa (7) de celebração da Paixão do Senhor, o cardeal Raniero
Cantalamessa reforçou o convite para se continuar - "mais convictos do que
nunca" - às palavras que dizemos a cada missa há dois mil anos, após a
consagração: “Anunciamos, Senhor, a vossa morte e proclamamos a vossa
ressurreição. Vinde, Senhor Jesus!”.
O homem no lugar de Deus
"A
Igreja anuncia e celebra, neste dia, a morte do Filho de Deus na cruz",
recorda o pregador da Casa Pontifícia, que logo lembra, porém, da
"existência de uma narrativa diversa" para a "morte de Deus -
ideológica, não histórica" proclamada "há um século e meio, e hoje,
em nosso ocidental descristianizado". Cantalamessa explica que "esta
morte diversa de Deus encontrou a sua perfeita expressão no conhecido anúncio
que Nietzsche põe na boca do 'homem louco', que chega sem fôlego à praça da
cidade: - Para onde foi Deus? – exclamou – É o que vou dizer. Nós o matamos –
vocês e eu!... nunca houve ação mais grandiosa e aqueles que nascerem depois de
nós pertencerão, por causa dela, a uma história mais elevada do que o foi
alguma vez toda essa história".
Uma ideia
de que "a história não seria mais dividida em antes de Cristo e depois de
Cristo, mas antes de Nietzsche e depois de Nietzsche", ou seja, continua
Cantalamessa, o homem, o “super-homem”, o “além-homem”, é colocado no lugar de
Deus. "Não demorará, contudo, a se dar conta de que, ao ficar só, o homem
não é nada"; pois "estamos errando como num nada infinito”.
A verdade transcendente
Mas,
"não nos é lícito julgar o coração de um homem que somente Deus
conhece", recorda o pregador da Casa Pontifícia, e também o autor daquele
anúncio teve a sua parte de sofrimento na vida. E Cantalamessa recorda a oração
de Jesus na cruz: “Pai, perdoa-lhes! Eles não sabem o que fazem!” (Lc
23,34). A consequência, porém, que aquele anúncio teve, "aquela sim,
podemos e devemos julgar", enfatiza o cardeal, pois acabou virando moda e
declinada nos mais diferentes modos:
"O
denominador comum a todas estas diversas declinações é o total relativismo em
todo campo: ética, linguagem, filosofia, arte e, naturalmente, religião. Nada
mais é sólido; tudo é líquido, ou mesmo vaporoso. Na época do romantismo,
deleitava-se na melancolia, hoje, no niilismo. Como crentes, é nosso dever
mostrar o que está por trás ou sob aquele anúncio, isto é, a trepidação de uma
antiga chama, a erupção repentina de um vulcão jamais extinto desde o início do
mundo."
Isto é,
afirma Cantalamessa: "há uma verdade transcendente que nenhuma narrativa
histórica ou raciocínio filosófico poderia nos transmitir":
“Cristo Jesus, existindo em
forma divina, não considerou um privilégio um privilégio ser igual a Deus, mas
esvaziou-se, assumindo a forma de servo e tornando-se semelhante ao ser humano.
E encontrado em aspecto humano, humilhou-se, fazendo-se obediente até a morte –
e morte de cruz!”
A ressureição conduz à apoteose da vida
Mas
"por que falar disto em uma liturgia da Sexta-feira Santa?", se
questiona o cardeal. "Não para convencer os ateus de que Deus não está
morto!", porque "para convencê-los são necessários outros meios, mais
do que as palavras de um velho pregador. Meios que o Senhor não deixará faltar
a quem tem o coração aberto à verdade". O verdadeiro objetivo "é
preservar os crentes – quem sabe, talvez apenas alguns estudantes
universitários – de serem atraídos para dentro deste vórtice do niilismo, que é
o verdadeiro 'buraco negro' do universo espiritual". O pregador da Casa
Pontifícia finaliza, então, a homilia:
“'Deus? Nós o matamos – vocês e
eu!': Esta coisa tremenda se realizou, de fato, uma vez na história humana, mas
em sentido bem diferente daquele bradado pelo 'homem louco'. Porque é verdade,
irmãos e irmãs: fomos nós - vocês e eu - que matamos Jesus de Nazaré! Ele
morreu pelos nossos pecados e também pelos de todo o mundo (1Jo 2,2). Mas a sua
ressurreição assegura-nos que este caminho não conduz à derrota, mas, graças ao
nosso arrependimento, conduz àquela 'apoteose da vida', em vão buscada em
outros lugares.”
Tradução das palavras do cardeal
Cantalamessa: Fr. Ricardo Farias, ofmcap
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