Em
2018, mais de 820 milhões de pessoas não tinham comida suficiente. É o que
revela o último relatório da ONU sobre o estado da segurança alimentar e
nutricional no mundo. Mons. Fernando Chica Arellano, Observador Permanente
junto aos organismo das Nações Unidas para a Alimentação e a Agricultura, falou
ao Vatican News sobre os desafios para combater a fome.
Barbara Castelli - Cidade do Vaticano
"A
humanidade não cumpriu suficientemente seu dever pelos irmãos mais
pobres". Com estas palavras, Mons. Fernando Chica Arellano, Observador
Permanente da Santa Sé junto à Organização das Nações Unidas para Agricultura e
Alimentação (FAO), ao Fundo Internacional para o Desenvolvimento Agrícola
(FIDA) e ao Programa Mundial de Alimentos (PAM), comenta o relatório de 2019
sobre o estado da segurança alimentar e nutricional no mundo. O documento foi
apresentado na terça-feira, 15, em Nova York, por cinco agências da ONU:
FAO, FIDA, UNICEF (Fundo para a Infância), PAM e OMS (Organização Mundial da
Saúde). O relatório faz parte do monitoramento dos progressos em direção ao
segundo Objetivo de Desenvolvimento Sustentável (ODS) - "Fome Zero" -
que visa derrotar a fome, promover a segurança alimentar e colocar fim a todas
as formas de desnutrição até 2030.
Os números
da crueldade da fome
Pelo terceiro ano consecutivo, a fome no mundo não dá sinais de
declínio: em 2018, cerca de 820 milhões de pessoas não tinham comida
suficiente, em comparação aos 811 milhões do ano anterior. As crianças com
baixo peso ao nascer são 20,5 milhões (1 em cada 7), as crianças com menos de 5
anos com desnutrição crônica são 148,9 milhões e aquelas que sofrem de
desnutrição aguda são 49,5 milhões. A fome está aumentando, de modo particular,
em países onde o crescimento econômico está ficando para trás, com baixa renda
média e aqueles cuja renda depende do comércio internacional de
matérias-primas.
Em contraposição a esta triste realidade, o relatório das Nações
Unidas também revela que no mundo está em aumento a obesidade e o número de
pessoas com excesso de peso, particularmente entre crianças em idade escolar e
adultos; e que as probabilidades de insegurança alimentar são maiores entre
mulheres do que entre os homens, em todos os continentes, com a maior diferença
na América Latina.
"O relatório - continua Mons. Fernando Chica Arellano na
entrevista concedida ao Vatican News - está nos dizendo que as pessoas por trás
desses números não têm um presente sereno nem um futuro luminoso". "A
comunidade internacional realmente deveria fazer mais - ressalta - falta a
vontade, sobretudo em remover as causas devidas ao homem, como os conflitos, a
crise econômica e as mudanças climáticas".
O
grito de ajuda que vem da Ásia e da África
O maior número de pessoas subnutridas (mais de 500 milhões) vive
na Ásia, principalmente na parte sul. Também na África, a situação é
extremamente alarmante, com as mais altas taxas de fome no mundo, que continuam
a aumentar lentamente, mas de forma constante, em quase todas as regiões.
Em particular, na África Oriental, cerca de um terço da
população (30,8%) está subnutrida. Além do clima e dos conflitos, o aumento é
favorecido pelas crises econômicas. O Observador Permanece junto às
organizações e organismos das Nações Unidas para alimentação e a agricultura,
enfatiza que "todos podemos fazer algo para combater a fome", antes
de tudo não desperdiçando alimentos e não cedendo à indiferença, como os
personagens da parábola do "bom samaritano". "A comunidade
internacional - acrescenta - deve crescer em solidariedade, porque a solidariedade,
o investimento na paz, são uma forma de lutar contra a fome".
Entrevista
com Mons. Fernando Chica Arellano
R. - Este
relatório nos diz que a humanidade não cumpriu suficientemente o seu dever em
relação aos nossos irmãos mais pobres. A fome continua a aumentar. Isso
evidencia - eu diria - a grandeza do desafio de atingir a meta de
desenvolvimento sustentável "Fome zero", até 2030. Portanto,
significa que devemos trabalhar mais para melhor cumprir nosso dever como
comunidade internacional e, sobretudo como pessoas, também em nível
individual. Os números são realmente muito eloquentes. Falemos da Ásia: 513,9
milhões de pessoas famintas. Falemos da África: 256,1 milhões de pessoas. Na
América Latina 42,5 milhões. Mas o relatório enfatiza não apenas a crueldade da
fome, mas também outro aspecto: a obesidade. Os adultos obesos do mundo são 672
milhões, 13%, ou uma pessoa em cada oito. Portanto, o problema não é somente a
desnutrição, mas também a má nutrição. O relatório, na verdade, está nos
dizendo que as pessoas que estão por trás desses números não têm um
presente sereno nem um futuro luminoso. A comunidade internacional realmente
deveria fazer mais. Falta a vontade, sobretudo na remoção das causas devidas ao
homem, como os conflitos, a crise econômica e as mudanças climáticas. Esses
três continuam a ser os fatores que produzem esses flagelos.
A
atenção aos últimos, a quem sofre, é um tema muito caro ao Papa Francisco. Como
é possível promover, também nas pequenas coisas, uma transformação estrutural
inclusiva?
R. - Todos
podemos fazer algo para lutar contra a fome. Primeiro de tudo, não desperdiçar
comida; depois, não passar, como fez o sacerdote ou o levita, diante do pobre
fechando os olhos ou não ouvindo o grito dos famintos. Isso a nível pessoal. A
nível paroquial e de outras ONGs, tantas coisas belas estão sendo feitas, há
bonitas iniciativas. Mas se pode fazer mais. Esse relatório é um impulso para
fazer mais. Depois a comunidade internacional deve crescer em solidariedade,
porque a solidariedade, o investimento na paz é uma forma de lutar contra a
fome. Se nós não derrotarmos a fome, todos os outros objetivos de
desenvolvimento sustentável da Agenda 2030, acredito que não poderão ser
alcançados. O objetivo número um e o objetivo número dois são fundamentais para
alcançar os outros 15 objetivos, que todos juntos sintetizam dizendo que não
devemos deixar ninguém para trás. O Papa Francisco, no dia 27 de junho, recebeu
a Conferência da FAO dizendo que este é um problema que deve envolver a todos,
porque o sofrimento de uma pessoa é o sofrimento de todos. Ele também fez um
apelo ao bom uso da água, sobretudo na produção de alimentos e em sua
distribuição mais justa, porque enquanto há países onde a comida está
avançando, sobretudo na África existem regiões inteiras onde, pelo contrário,
ela está faltando. Essa desigualdade é verdadeiramente cruel.
Fonte: Vatican News
Nenhum comentário:
Postar um comentário