Francisco
presidiu a celebração penitencial na Basílica de São Pedro, no final da qual
recitou a oração de Consagração da humanidade a Nossa Senhora, em particular a
Rússia e a Ucrânia. As Igrejas no mundo unidas ao Papa.
Vatican News
O Papa Francisco presidiu a Celebração da
Penitência com o Ato de Consagração ao Imaculado Coração de Maria, na Basílica
de São Pedro, na tarde desta sexta-feira (25/03), Solenidade da Anunciação do
Senhor.
O Anjo Gabriel toma a palavra por três vezes para
se dirigir à Virgem Maria. "A primeira vez, quando a saúda com estas
palavras: «Alegra-Te, ó cheia de graça: o Senhor está contigo». O motivo para
rejubilar, o motivo da alegria, é desvendado em poucas palavras: o Senhor está
contigo", disse o Papa em sua homilia.
Segundo Francisco, "muitas vezes pensamos que
a Confissão consiste em ir de cabeça inclinada ao encontro de Deus. Mas voltar
para o Senhor não é primariamente obra nossa; é Ele que nos vem visitar,
cumular da sua graça, alegrar com o seu júbilo. Confessar-se é dar ao Pai a
alegria de nos levantar de novo. No centro daquilo que vamos viver, não estão
os nossos pecados, mas o seu perdão".
Restituamos à graça o primado e peçamos o dom de
compreender que a Reconciliação consiste antes de tudo, não num passo nosso
para Deus, mas no seu abraço que nos envolve, deslumbra, comove. É o Senhor que
entra em nossa casa, como na de Maria em Nazaré, e traz um deslumbramento e uma
alegria antes desconhecidos. Como primeiro plano foquemos a perspectiva em
Deus: voltaremos a gostar da Confissão. Precisamos dela, porque cada renascimento
interior, cada viragem espiritual começa daqui, do perdão de Deus. Não
negligenciemos a Reconciliação, mas voltemos a descobri-la como o sacramento da
alegria. Sem qualquer rigidez, sem criar obstáculos nem incômodos; portas
abertas à misericórdia!
A segunda vez que o Anjo fala a Maria, perturbada
com a saudação recebida, é para Lhe dizer: «Não temas». Segundo Francisco,
"na Sagrada Escritura, quando Deus aparece, gosta de dirigir estas duas
palavras a quem O acolhe: não temas. Deste modo transmite-nos uma mensagem
clara e reconfortante: sempre que a vida se abre a Deus, o medo deixa de
ter-nos como reféns. A Virgem Maria nos acompanha: Ela mesma deixou a sua
perturbação em Deus. O anúncio do Anjo dava-Lhe razões sérias para não temer.
Propunha-Lhe algo de inimaginável, que estava para além das suas forças e,
sozinha, não poderia levá-lo para diante: haveria muitas dificuldades,
problemas com a lei mosaica, com José, com as pessoas da sua terra e do seu
povo. Mas Maria não levanta objeções. Basta-Lhe aquele não temas, basta-Lhe a
garantia de Deus. Agarra-Se a Ele, como queremos nós fazer esta noite. Porque
muitas vezes fazemos o contrário: partimos das nossas certezas e, só quando as
perdemos, é que vamos ter com Deus. Nossa Senhora ensina-nos o contrário:
partir de Deus, com a confiança de que, assim, tudo o mais nos será dado.
Convida-nos a ir à fonte, ao Senhor, que é o remédio radical contra o medo e os
perigos da existência".
Nestes dias, notícias e imagens de morte continuam
entrando dentro de nossas casas, enquanto as bombas destroem as casas de muitos
dos nossos irmãos e irmãs ucranianos inermes. A guerra brutal, que se abateu
sobre tantos e que a todos faz sofrer, provoca em cada um medo e consternação.
Notamos dentro de nós uma sensação de impotência e inadequação. Precisamos
ouvir dizer-nos: «não temas». Mas não bastam as garantias humanas, é necessária
a presença de Deus, a certeza do perdão divino, o único que apaga o mal,
desativa o rancor, restitui a paz ao coração. Voltemos a Deus, ao seu perdão.
Pela terceira vez, o Anjo retoma a palavra, para
dizer a Nossa Senhora: «O Espírito Santo virá sobre Ti». "É assim que Deus
intervém na história: dando o seu próprio Espírito. Porque nas coisas que
contam, não bastam as nossas forças. Por nós sozinhos somos incapazes de
resolver as contradições da história ou mesmo as do nosso coração. Precisamos
da força sapiente e suave de Deus, que é o Espírito Santo. Precisamos do
Espírito de amor, que dissolve o ódio, apaga o rancor, extingue a ganância,
desperta-nos da indiferença. Precisamos do amor de Deus, porque o nosso amor é
precário e insuficiente. Pedimos tantas coisas ao Senhor, mas muitas vezes
esquecemo-nos de Lhe pedir o que é mais importante e que Ele nos deseja dar: o
Espírito Santo, a força para amar", frisou o Papa.
Segundo Francisco, "se quisermos que mude o
mundo, tem de mudar primeiro o nosso coração. Para o conseguirmos, deixemos
hoje que Nossa Senhora nos leve pela mão. Olhemos para o seu Imaculado Coração,
onde Deus descansou, para o único Coração de criatura humana sem sombras. Ela é
«cheia de graça» e, portanto, vazia de pecado: n’Ela não há vestígios de mal e,
assim, com Ela Deus pôde iniciar uma história nova de salvação e de paz.
Naquele ponto, a história deu uma virada. Deus mudou a história, batendo à
porta do Coração de Maria".
E hoje também nós, renovados pelo perdão de Deus,
batemos à porta daquele Coração. Em união com os Bispos e os fiéis do mundo
inteiro, desejo solenemente levar ao Imaculado Coração de Maria tudo o que
estamos vivendo: renovar-Lhe a consagração da Igreja e da humanidade inteira e
consagrar-Lhe de modo particular o povo ucraniano e o povo russo, que, com
afeto filial, a veneram como Mãe. Não se trata duma fórmula mágica, mas dum ato
espiritual. É o gesto da entrega plena dos filhos que, na tribulação desta
guerra cruel e insensata que ameaça o mundo, recorrem à Mãe, lançando no seu
Coração medo e sofrimento, entregando-se a si mesmos. É colocar naquele Coração
límpido, incontaminado, onde Deus se espelha, os bens preciosos da fraternidade
e da paz, tudo o temos e somos, para que seja Ela – a Mãe que o Senhor nos deu
– a proteger-nos e guardar-nos.
Dos lábios de Maria brotou a frase mais bela que o
Anjo pudesse referir a Deus: «Faça-se em Mim segundo a tua palavra». "Esta
aceitação por parte de Nossa Senhora não é uma aceitação passiva nem resignada,
mas o desejo vivo de aderir a Deus, que tem «desígnios de paz e não de
desgraça». É a participação mais íntima no seu plano de paz para o mundo.
Consagramo-nos a Maria para entrar neste plano, para nos colocarmos à inteira
disposição dos desígnios de Deus. A Mãe de Deus, depois de ter dito o seu sim,
empreendeu uma longa viagem subindo até uma região montanhosa para visitar a
prima grávida. Hoje, que Ela tome pela mão o nosso caminho e o guie, através
das veredas íngremes e cansativas da fraternidade e do diálogo, pela senda da
paz", concluiu o Papa.
A oração do ato de consagração
Ao final da da liturgia penitencial na Basílica de
São Pedro, o Papa pronuncia a seguinte oração para consagrar e confiar a
humanidade, e especialmente a Rússia e a Ucrânia, ao Imaculado Coração de
Maria:
"Ó Maria, Mãe de Deus e nossa Mãe, recorremos
a Vós nesta hora de tribulação. Vós sois Mãe, amais-nos e conheceis-nos: de
quanto temos no coração, nada Vos é oculto. Mãe de misericórdia, muitas vezes
experimentamos a vossa ternura providente, a vossa presença que faz voltar a
paz, porque sempre nos guiais para Jesus, Príncipe da paz.
Mas perdemos o caminho da paz. Esquecemos a lição
das tragédias do século passado, o sacrifício de milhões de mortos nas guerras
mundiais. Descuidamos os compromissos assumidos como Comunidade das Nações e
estamos a atraiçoar os sonhos de paz dos povos e as esperanças dos jovens.
Adoecemos de ganância, fechamo-nos em interesses nacionalistas, deixamo-nos
ressequir pela indiferença e paralisar pelo egoísmo. Preferimos ignorar Deus,
conviver com as nossas falsidades, alimentar a agressividade, suprimir vidas e
acumular armas, esquecendo-nos que somos guardiões do nosso próximo e da
própria casa comum. Dilaceramos com a guerra o jardim da Terra, ferimos com o
pecado o coração do nosso Pai, que nos quer irmãos e irmãs. Tornamo-nos
indiferentes a todos e a tudo, exceto a nós mesmos. E, com vergonha, dizemos:
perdoai-nos, Senhor!
Na miséria do pecado, das nossas fadigas e
fragilidades, no mistério de iniquidade do mal e da guerra, Vós, Mãe Santa,
lembrai-nos que Deus não nos abandona, mas continua a olhar-nos com amor,
desejoso de nos perdoar e levantar novamente. Foi Ele que Vos deu a nós e
colocou no vosso Imaculado Coração um refúgio para a Igreja e para a
humanidade. Por bondade divina, estais connosco e conduzis-nos com ternura
mesmo nos transes mais apertados da história.
Por isso recorremos a Vós, batemos à porta do vosso
Coração, nós os vossos queridos filhos que não Vos cansais de visitar em todo o
tempo e convidar à conversão. Nesta hora escura, vinde socorrer-nos e
consolar-nos. Repeti a cada um de nós: «Não estou porventura aqui Eu, que sou
tua mãe?» Vós sabeis como desfazer os emaranhados do nosso coração e desatar os
nós do nosso tempo. Repomos a nossa confiança em Vós. Temos a certeza de que
Vós, especialmente no momento da prova, não desprezais as nossas súplicas e
vindes em nosso auxílio.
Assim fizestes em Caná da Galileia, quando
apressastes a hora da intervenção de Jesus e introduzistes no mundo o seu
primeiro sinal. Quando a festa se mudara em tristeza, dissestes-Lhe: «Não têm
vinho!» (Jo 2, 3). Ó Mãe, repeti-o mais uma vez a Deus, porque hoje
esgotamos o vinho da esperança, desvaneceu-se a alegria, diluiu-se a
fraternidade. Perdemos a humanidade, malbaratamos a paz. Tornamo-nos capazes de
toda a violência e destruição. Temos necessidade urgente da vossa intervenção
materna.
Por isso acolhei, ó Mãe, esta nossa súplica:
Vós, estrela do mar, não nos deixeis naufragar na
tempestade da guerra;
Vós, arca da nova aliança, inspirai projetos e
caminhos de reconciliação;
Vós, «terra do Céu», trazei de volta ao mundo a
concórdia de Deus;
Apagai o ódio, acalmai a vingança, ensinai-nos o
perdão;
Libertai-nos da guerra, preservai o mundo da ameaça
nuclear;
Rainha do Rosário, despertai em nós a necessidade
de rezar e amar;
Rainha da família humana, mostrai aos povos o
caminho da fraternidade;
Rainha da paz, alcançai a paz para o mundo.
O vosso pranto, ó Mãe, comova os nossos corações
endurecidos. As lágrimas, que por nós derramastes, façam reflorescer este vale
que o nosso ódio secou. E, enquanto o rumor das armas não se cala, que a vossa
oração nos predisponha para a paz. As vossas mãos maternas acariciem quantos
sofrem e fogem sob o peso das bombas. O vosso abraço materno console quantos
são obrigados a deixar as suas casas e o seu país. Que o vosso doloroso Coração
nos mova à compaixão e estimule a abrir as portas e cuidar da humanidade ferida
e descartada.
Santa Mãe de Deus, enquanto estáveis ao pé da
cruz, Jesus, ao ver o discípulo junto de Vós, disse-Vos: «Eis o teu filho!» (Jo 19,
26). Assim Vos confiou cada um de nós. Depois disse ao discípulo, a cada um de
nós: «Eis a tua mãe!» (19, 27). Mãe, agora queremos acolher-Vos na nossa vida e
na nossa história. Nesta hora, a humanidade, exausta e transtornada, está ao pé
da cruz convosco. E tem necessidade de se confiar a Vós, de se consagrar a
Cristo por vosso intermédio. O povo ucraniano e o povo russo, que Vos veneram
com amor, recorrem a Vós, enquanto o vosso Coração palpita por eles e por todos
os povos ceifados pela guerra, a fome, a injustiça e a miséria.
Por isso nós, ó Mãe de Deus e nossa, solenemente
confiamos e consagramos ao vosso Imaculado Coração nós mesmos, a Igreja e a
humanidade inteira, de modo especial a Rússia e a Ucrânia. Acolhei este nosso
ato que realizamos com confiança e amor, fazei que cesse a guerra, providenciai
ao mundo a paz. O sim que brotou do vosso Coração abriu as portas da história
ao Príncipe da Paz; confiamos que mais uma vez, por meio do vosso Coração, virá
a paz. Assim a Vós consagramos o futuro da família humana inteira, as
necessidades e os anseios dos povos, as angústias e as esperanças do mundo.
Por
vosso intermédio, derrame-se sobre a Terra a Misericórdia divina e o doce
palpitar da paz volte a marcar as nossas jornadas. Mulher do sim, sobre Quem
desceu o Espírito Santo, trazei de volta ao nosso meio a harmonia de Deus.
Dessedentai a aridez do nosso coração, Vós que «sois fonte viva de esperança».
Tecestes a humanidade para Jesus, fazei de nós artesãos de comunhão.
Caminhastes pelas nossas estradas, guiai-nos pelas sendas da paz. Amen."
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