Marcelo Musa Cavallari/ACI Digital
SÃO
PAULO, 06 abr. 21 / 01:00 pm (ACI).- O ministro Gilmar
Mendes, do Supremo Tribunal Federal, negou, em decisão emitida na segunda-feira
5 de abril, medida cautelar que pedia o fim da proibição de missas e cultos
públicos estabelecida por um decreto do governador de São Paulo, João Doria.
O
pedido, feito pelo diretório estadual do Partido Social Democrático, alegava
que o decreto “sob a justificativa de instituir medidas de contenção à
transmissão do novo coronavírus, estabeleceu restrições totais ao direito
constitucional à liberdade religiosa e de culto das religiões que adotam
atividades de caráter coletivo, criando tanto proibição inconstitucional,
quanto discriminação inconstitucional, tendo em vista a existência de práticas
religiosas que não possuem ritos que envolvem atividades coletivas”
Mendes,
sorteado como relator da ação do PSD, não tomaria decisão alguma, segundo o
jornal Folha de S. Paulo. Diante da decisão tomada pelo também ministro do STF
Kássio Nunes Marques no domingo de Páscoa que permitiu a abertura de igrejas em
todo o país no domingo de Páscoa, Mendes resolveu se manifestar.
Na
opinião de Mendes, o decreto do governo paulista não viola o direito
fundamental de liberdade religiosa assegurado pela Constituição Federal, que
diz em seu artigo 5º: "é inviolável a liberdade de consciência e de
crença, sendo assegurado o livre exercício dos cultos religiosos e garantida,
na forma da lei, a proteção aos locais de culto e a suas liturgias."
Para
argumentar em defesa de sua posição, o ministro Gilmar Mendes cita a si mesmo:
“Como já tive a oportunidade de esclarecer no âmbito doutrinário, a lei deve
proteger os templos e não deve interferir nas liturgias, ‘a não ser que assim o
imponha algum valor constitucional concorrente de maior peso na hipótese
considerada’.”
Como critérios balizadores, Mendes arrola três perguntas em sua decisão.
“Delimitado esse âmbito de proteção da liberdade religiosa, indaga-se: o
Decreto do Estado de São Paulo de alguma maneira impede que os cidadãos
respondam apenas à própria consciência, em matéria religiosa? A restrição
temporária de frequentar eventos religiosos públicos traduz ou promove,
dissimuladamente, alguma religião? A interdição de templos e edifícios
equiparados acarreta coercitiva conversão dos indivíduos para esta ou aquela
visão religiosa?” E ele mesmo responde: “Certamente que não”.
Depois
de decidir contra a abertura de igrejas, Mendes pediu, no texto da sua decisão,
que a questão fosse levada ao plenário do STF e o presidente do tribunal,
ministro Luiz Fux, pautou a discussão para amanhã (quarta-feira, 7 de abril).
Prevê-se uma vitória folgada da posição adotada por Mendes, até porque ela
acompanha várias decisões já tomadas pelo STF ao longo da pandemia de Covid-19
no sentido de que o Estado tem poder de fechar igrejas.
Mas
a convicção de Mendes de que sua resposta a suas próprias perguntas decide a
questão não é unânime. O Procurador-geral da República, Augusto Aras,
apresentou ao STF uma manifestação de apoio à ação movida pelo PSD contra o
decreto de Doria, em que afirma que o decreto do governo de São Paulo é
inscontitucional.
"Observados
os protocolos setoriais relativos a cada matriz religiosa e atendidas as
medidas sanitárias definidas pelo Ministério da Saúde, há de ser assegurada a
realização de cultos, missas e demais atividades religiosas de caráter
coletivo", diz o procurador em sua manifestação.
Para
os Católicos, ir à missa não é apenas uma forma coletiva de
rezar. A missa é um sacrifício que só pode ser realizado por um sacerdote
regulamente ordenado.
Diz
o Catecismo da Igreja Católica:
“A Eucaristia é o coração e o cume da vida da
Igreja porque nela Cristo associa a sua Igreja e todos os seus membros ao seu
sacrifício de louvor e de acção de graças, oferecido ao Pai uma vez por todas
na cruz. (nº 1407)”
Além
disso, a afirmação de que “é o próprio Cristo, sumo e eterno sacerdote da Nova
Aliança, que, agindo pelo ministério dos sacerdotes, oferece o sacrifício
eucarístico. E é ainda o mesmo Cristo, realmente presente sob as espécies do
pão e do vinho, que é a oferenda do sacrifício eucarístico” (1410) distingue os
católicos de outras confissões cristãs.
Assim,
não parece tão claro quanto quer o ministro Gilmar Mendes que um decreto que
proíba a celebração pública do sacrifício eucarístico não acarrete “coercitiva
conversão dos indivíduos para esta ou aquela visão religiosa”.
Além
disso, o Código de Direito Canônico ordena que “no domingo e nos outros dias
festivos de preceito os fiéis têm obrigação de participar na Missa (Cânon
1247)”. Assim, proibir a frequentação da missa como faz o decreto do governo
paulista e de outros governadores de Estado do Brasil parece que “impede que os
cidadãos respondam apenas à própria consciência, em matéria religiosa”, a primeira
das perguntas definidoras do ministro Gilmar Mendes. A consciência de um
católico o obriga a cumprir o preceito da missa dominical.
Uma
vez que “só os sacerdotes validamente ordenados podem presidir à Eucaristia e
consagrar o pão e o vinho, para que se tornem o corpo e o sangue do Senhor
(Catecismo nº 1411)”, não cabe o argumento de que os fiéis não precisam das
igrejas abertas. Eles podem, e devem, certamente rezar em suas casas. Mas não
podem cumprir o mandamento de participar da Eucaristia, “coração e o cume da
vida da Igreja”.
O
ministro Gilmar Mendes diz em sua decisão, que “mesmo que se cogitasse que o
Decreto impugnado nesta ADPF configura uma restrição no núcleo essencial do
direito fundamental de liberdade religiosa, não há como examinar a constitucionalidade
dessa restrição senão utilizando as balizas fixadas por este Supremo Tribunal
Federal para adoção de medidas sanitárias de combate à pandemia da COVID-19.”
Os bispos brasileiros
têm tomado a decisão de manter as igrejas sob sua juridição fechadas quando as
autoridades sanitárias indicam a conveniência dessa medida. O que o Supremo
Tribunal Federal debate amanhã, no entanto, não é essa conveniência. O que está
em discussão é se o Estado, seja por meio de seu poder executivo, judiciário ou
legislativo, pode determinar se igrejas abrem ou fecham.
Fonte:
ACI Digital
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