Na
catequese da Audiência Geral desta quarta-feira, o Papa disse que “para sairmos
melhores de uma crise como a atual, que é uma crise de saúde e ao mesmo tempo
social, política e econômica, cada um de nós é chamado a assumir a sua parte de
responsabilidade".
Mariangela Jaguraba - Vatican News
O
Papa Francisco prosseguiu com o ciclo de catequeses sobre o tema da pandemia de
coronavírus, na Audiência Geral desta quarta-feira (23/09).
“Curar o mundo. Subsidiariedade e virtude da esperança” foi tema deste encontro
semanal, realizado no Pátio São Dâmaso, dentro do Vaticano, em que o Pontífice
ressaltou que “para sairmos melhores de uma crise como a atual, que é uma crise
de saúde e ao mesmo tempo social, política e econômica, cada um de nós é
chamado a assumir a sua parte de responsabilidade. Partilhar as
responsabilidades”.
Princípio de subsidiariedade para
uma verdadeira reconstrução
Segundo Francisco, “devemos responder não só como indivíduos,
mas também a partir do próprio grupo de pertença, do papel que desempenhamos na
sociedade, dos nossos princípios e, se acreditamos, da nossa fé em Deus”.
Muitas vezes, porém, tantas pessoas não podem participar na
reconstrução do bem comum porque são marginalizadas, excluídas ou ignoradas;
certos grupos sociais são incapazes de contribuir, porque são econômica ou
politicamente asfixiados. Em algumas sociedades, muitas pessoas não são livres
de expressar a sua fé e os seus valores, suas ideias: se elas as expressam com
liberdade, vão para a cadeia. Noutros lugares, especialmente no mundo
ocidental, muitas reprimem as próprias convicções éticas ou religiosas. Mas
assim não se pode sair da crise, ou contudo, não podemos sair melhores.
Sairemos piores.
“Para que todos possamos participar no cuidado e na regeneração
dos nossos povos, é justo que todos tenham os recursos adequados para fazê-lo”,
disse ainda o Papa, ressaltando que “após a grande depressão econômica de 1929,
o Papa
Pio XI explicou a importância do princípio de
subsidiariedade para uma verdadeira reconstrução. Este
princípio tem um duplo dinamismo: de cima para baixo e de baixo para cima. Talvez
não entendemos o que isso significa, mas é um principio social que nos torna
mais unidos”. E Francisco explicou:
“Por um lado, e
especialmente em tempos de mudança, quando indivíduos, famílias, pequenas
associações ou comunidades locais são incapazes de alcançar os objetivos
primários, então é justo que os níveis mais elevados do corpo social, como o
Estado, intervenham para oferecer os recursos necessários para prosseguir.”
Por exemplo, devido ao lockdown causado pelo coronavírus, muitas
pessoas, famílias e atividades econômicas encontraram-se e ainda se encontram
em sérias dificuldades, por isso as instituições públicas procuram ajudar com
intervenções apropriadas, sociais, econômicas e de saúde. Esta é a função. O
que devem fazer.
Não colocar de lado a sabedoria dos grupos mais humildes
“Mas por outro lado”, disse ainda Francisco, “os vértices da sociedade devem respeitar e promover níveis intermédios ou menores. Com efeito, é decisiva a contribuição de indivíduos, famílias, associações, empresas, todos os organismos intermédios e até das Igrejas. Com os próprios recursos culturais, religiosos, econômicos ou de participação cívica, eles revitalizam e reforçam o corpo social. Existe uma colaboração de cima para baixo, do Estado para o povo e de baixo para cima. E este é o exercício do princípio da subsidiariedade.
Cada
um deve ter a oportunidade de assumir a própria responsabilidade nos processos
de cura da sociedade da qual faz parte. Quando se ativa algum projeto
que, direta ou indiretamente, diz respeito a determinados grupos sociais, estes
não podem ser excluídos da participação; a sabedoria dos grupos mais humildes
não pode ser colocada de lado”. A seguir, acrescentou:
“Infelizmente, esta
injustiça ocorre muitas vezes onde se concentram grandes interesses econômicos
ou geopolíticos, tais como certas atividades de mineração em determinadas
partes do planeta. As vozes dos povos indígenas, as suas culturas e visões do
mundo não são consideradas. Atualmente, esta falta de respeito pelo princípio
da subsidiariedade propagou-se como um vírus.”
Pensemos nas grandes medidas de ajuda financeira implementadas
pelos Estados. Ouvimos mais as grandes empresas financeiras do que as pessoas
ou aqueles que movem a economia real. Ouvimos mais as empresas multinacionais
do que os movimentos sociais. Falando em dialeto cotidiano, ouvimos mais os
poderosos do que os fracos e este não é o caminho. Não é o caminho humano, não
é o caminho que Jesus nos ensinou, não é implementar o princípio de subsidiariedade.
Assim, não permitimos que as pessoas sejam “protagonistas do próprio resgate”.
No subconsciente coletivo de alguns políticos ou alguns trabalhadores sociais
há este lema: tudo para o povo, nada com o povo. De cima para baixo, mas sem
ouvir a sabedoria do povo, sem implementar essa sabedoria na solução de
problemas, neste caso, para sair da crise. Ou pensemos também na forma de curar
o vírus: ouvimos mais as grandes empresas farmacêuticas do que os profissionais
da saúde, que estão na linha da frente nos hospitais ou nos campos de
refugiados. Este não é o caminho certo! Todos devem ser ouvidos. Os que estão
no alto e os que estão embaixo.
Implementar o princípio de
subsidiariedade
Segundo o Papa, “para sairmos melhores de uma crise, o princípio
da subsidiariedade deve ser implementado, respeitando a autonomia e a
capacidade de iniciativa de todos, especialmente dos últimos.
“Todas as partes de um corpo
são necessárias e, como diz São Paulo, as partes que podem parecer mais frágeis
e menos importantes são na realidade as mais necessárias. À luz desta imagem,
podemos dizer que o princípio da subsidiariedade permite a cada um assumir o
seu próprio papel no cuidado e destino da sociedade.”
A sua implementação dá esperança num futuro
mais saudável e justo; e construímos este futuro juntos, aspirando a realidades
maiores, alargando os nossos horizontes. Sair da crise não significa passar um
verniz na situação atual. Sair da crise significa mudar e a verdadeira mudança
é feita por todos, todas as pessoas que constituem o povo. Todos juntos em
comunidade.”
A esperança é audaz
O Papa recordou que “numa catequese anterior vimos que a solidariedade é
a saída para a crise: ela nos une e nos permite encontrar propostas sólidas
para um mundo mais saudável. Mas este caminho de solidariedade precisa da subsidiariedade. Com
efeito, não há verdadeira solidariedade sem participação social, sem a
contribuição de organismos intermédios: famílias, associações, cooperativas,
pequenas empresas, expressões da sociedade civil. Tal participação ajuda a
prevenir e corrigir certos aspectos negativos da globalização e da ação dos
Estados, assim como acontece no cuidado das pessoas atingidas pela pandemia.
Estas contribuições “a partir de baixo” devem ser encorajadas. Como é
bonito ver o trabalho dos voluntários nessa crise, voluntários provenientes de
várias partes sociais, que vêm de famílias abastadas e mais pobres. Todos
juntos. Isso é solidariedade e princípio da subsidiariedade”.
Durante o lockdown, o gesto de aplaudir médicos, enfermeiros e
enfermeiras nasceu espontaneamente como sinal de encorajamento e esperança.
Muitos arriscaram a sua vida e perderam suas vidas! Estendamos este aplauso a
todos os membros do corpo social, pela sua valiosa contribuição, por menor que
seja. Dar espaço para trabalhar. Aplaudamos os "descartados",
classificados por essa cultura como "descartados", ou seja, os
idosos, as crianças, as pessoas com deficiência, os trabalhadores, todos
aqueles que se põem a serviço. Mas não nos limitemos apenas aos aplausos! A
esperança é audaz, por isso encorajemo-nos a sonhar alto, procurando os ideais
de justiça e amor social que provêm da esperança.
O Papa concluiu a sua catequese, convidando a “não reconstruir o
passado, especialmente o que era iníquo e já doente. Construamos um futuro onde
a dimensão local e global se enriqueçam mutuamente, onde a beleza e a riqueza
dos grupos menores possam florescer e onde aqueles que têm mais se comprometam
a servir e a dar mais a quem tem menos”.
Fonte: Vatican News
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