O significado das cinzas
O uso litúrgico das cinzas tem sua origem no Antigo
Testamento. As cinzas simbolizam dor, morte e penitência. Por exemplo, no livro
de Ester, Mardoqueu se veste de saco e se cobre de cinzas quando soube do
decreto do Rei Asuer I (Xerxes, 485-464 antes de Cristo) da Pérsia que condenou
à morte todos os judeus de seu império. (Est 4,1). Jó (cuja história foi
escrita entre os anos VII e V antes de Cristo) mostrou seu arrependimento
vestindo-se de saco e cobrindo-se de cinzas (Jó 42,6). Daniel (cerca de 550 antes
de Cristo) ao profetizar a captura de Jerusalém pela Babilônia, escreveu:
“Volvi-me para o Senhor Deus a fim de dirigir-lhe uma oração de súplica,
jejuando e me impondo o cilício e a cinza” (Dn 9,3). No século V antes de
Cristo, logo depois da pregação de Jonas, o povo de Nínive proclamou um jejum a
todos e se vestiram de saco, inclusive o Rei, que além de tudo levantou-se de
seu trono e sentou sobre cinzas (Jn 3,5-6). Estes exemplos retirados do Antigo
Testamento demonstram a prática estabelecida de utilizar cinzas como símbolo
(algo que todos compreendiam) de arrependimento.
O próprio Jesus fez referência ao uso das cinzas. A
respeito daqueles povos que se recusavam a se arrepender de seus pecados,
apesar de terem visto os milagres e escutado a Boa Nova, Nosso Senhor proferiu:
“Ai de ti, Corozaim! Ai de ti, Betsaida! Porque se tivessem sido feitos em Tiro
e em Sidônia os milagres que foram feitos em vosso meio, há muito tempo elas se
teriam arrependido sob o cilício e as cinzas. (Mt 11,21) A Igreja, desde os
primeiros tempos, continuou a prática do uso das cinzas com o mesmo simbolismo.
Em seu livro “De Poenitentia” , Tertuliano (160-220 DC), prescreveu que um
penitente deveria “viver sem alegria vestido com um tecido de saco rude e
coberto de cinzas”. O famoso historiador dos primeiros anos da igreja, Eusébio
(260-340 DC), relata em seu livro A História da Igreja, como um apóstata de
nome Natalis se apresentou vestido de saco e coberto de cinzas diante do Papa
Ceferino, para suplicar-lhe perdão. Sabe-se que num determinado momento existiu
uma prática que consistia no sacerdote impor as cinzas em todos aqueles que
deviam fazer penitência pública. As cinzas eram colocadas quando o penitente
saía do Confessionário.
Já no período medieval, por volta do século VIII,
àquelas pessoas que estavam para morrer eram deitadas no chão sobre um tecido
de saco coberto de cinzas. O sacerdote benzia o moribundo com água benta
dizendo-lhe: “Recorda-te que és pó e em pó te converterás”. Depois de aspergir
o moribundo com a água benta, o sacerdote perguntava: “Estás de acordo com o
tecido de saco e as cinzas como testemunho de tua penitência diante do Senhor
no dia do Juízo?” O moribundo então respondia: “Sim, estou de acordo”. Se podem
apreciar em todos esses exemplos que o simbolismo do tecido de saco e das
cinzas serviam para representar os sentimentos de aflição e arrependimento, bem
como a intenção de se fazer penitência pelos pecados cometidos contra o Senhor
e a Sua igreja.
Com o passar dos tempos o uso das cinzas foi adotado
como sinal do início do tempo da Quaresma; o período de preparação de quarenta
dias (excluindo-se os domingos) antes da Páscoa da Ressurreição. O ritual para
a Quarta-feira de Cinzas já era parte do Sacramental Gregoriano.
As primeiras edições deste sacramental datam do
século VII. Na nossa liturgia atual da Quarta-feira de Cinzas, utilizamos
cinzas feitas com os ramos de palmas distribuídos no ano anterior no Domingo de
Ramos. O sacerdote abençoa as cinzas e
as impõe na fronte de cada fiel traçando com essas o Sinal da Cruz. Logo em
seguida diz: “Recorda-te que és pó e em pó te converterás” ou então
“Arrepende-te e crede no Evangelho”.
Devemos nos preparar para o começo da Quaresma
compreendendo o significado profundo das cinzas que recebemos. É um tempo para
examinar nossas ações atuais e passadas e lamentarmo-nos profundamente por
nossos pecados. Só assim poderemos voltar nossos corações genuinamente para
Nosso Senhor, que sofreu, morreu e ressuscitou pela nossa salvação.
Além do mais esse tempo nos serve para renovar
nossas promessas batismais, quando morremos para a vida passada e começamos uma
nova vida em Cristo.
Finalmente, conscientes que as coisas desse mundo
são passageiras, procuremos viver de agora em diante com a firme esperança no
futuro e a plenitude do Céu. ( Pe. Brendan Colleman Mc Donald)
BÊNÇÃO
E IMPOSIÇÃO DAS CINZAS NO INÍCIO DA QUARESMA
Aceitando que nos imponham as cinzas, expressamos
duas realidades fundamentais:
1. Somo criaturas mortais; tomar consciência de nossa fragilidade, de
inevitável fim de nossa existência terrestre, nos ajuda a avaliar melhor os
rumos que compete dar à nossa vida: “você é pó, e ao pó voltará” (Gn 3, 19).
Somo chamado;
2. Somos chamados a nos converter ao Evangelho de Jesus e sua proposta do
Reino, mudando nossa maneira de ver, pensar, agir.
Muitas comunidades sem padre assumiram esse rito significativo como
abertura da quaresma anual, realizando-o numa celebração das Palavras.
Veja mais embasamentos bíblicos sobre as cinzas
através das seguintes passagens: (Nm 19; Hb 9,13); como sinal de
transitoriedade (Gn 18,27; Jó 30,19). Como sinal de luto (2Sm 13,19; Sl 102,10;
Ap 19,19). Como sinal de penitência (Dn 9,3; Mt 11,21). Faça uma pesquisa
através de todas estas passagens bíblicas, prestando atenção ao texto e
seu contexto, relacionando com a vida pessoal, comunitária, social e com o rito
litúrgico da Quarta-feira de cinzas.
(FONTE - MISSAL DOMINICAL, página de 140, © Paulus, 1997).
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