No
voo Tóquio-Roma Francisco reitera a forte mensagem de Hiroshima, expressando
dúvidas também sobre as centrais nucleares até que não haja segurança total. A
propósito da investigação financeira, ele diz: "Estou contente porque é a
primeira vez que no Vaticano a panela é destampada a partir de dentro, não de
fora”.
Do voo Tóquio-Roma
“O uso das armas nucleares é imoral,
por isso deve ser introduzido no Catecismo da Igreja Católica (CIC), e não
somente o uso, mas também a posse, porque um acidente, ou a loucura de algum
governante, a loucura de um pode destruir a humanidade.” No diálogo durante o
voo que de Tóquio o trazia de volta para Roma, o Papa Francisco respondeu a
muitas perguntas dos jornalistas a bordo, reiterando a forte condenação
pronunciada em Hiroshima no sentido de fazer compreender o seu valor
magisterial. Eis a transcrição feita pelo Vatican News.
“Agradeço a vocês pelo trabalho –
disse o Papa no início do encontro –, por uma viagem intensa com uma mudança de
categoria: uma coisa era a Tailândia e outra o Japão. Não se pode avaliar as
coisas com as mesmas categorias, as realidades devem ser avaliadas com aquilo
que provém da categoria em questão. Japão e Tailândia são duas realidades
completamente diferentes. Por isso é necessário o trabalho dobrado, e obrigado
a vocês por isso, também pelos dias muito intensos, eu me senti próximo de
vocês neste trabalho.”
Padre Makoto Yamamoto, Catholic
Shimbum
Nós agradecemos ao senhor de coração
por ter vindo de muito distante ao Japão. Sou sacerdote diocesano próximo de
Nagasaki. O senhor visitou Nagasaki e Hiroshima, como se sentiu? A sociedade e
a Igreja ocidental têm algo a aprender da sociedade e da Igreja oriental?
“Começo pela última. Um dito me
iluminou muito: lux ex Oriente, ex Occidente luxus. A luz vem do
Oriente, o luxo, o consumismo vem do Ocidente. Há essa sabedoria oriental, que
não é sabedoria somente de conhecimento, mas de tempos, de contemplação. Ajuda
muito à nossa sociedade ocidental – sempre demasiadamente às pressas – aprender
a contemplação, a deter-se e olhar as coisas também poeticamente. Essa é uma
opinião pessoal, mas creio que falte ao Ocidente um pouco de poesia a mais. Há
coisas poéticas belíssimas, mas o Oriente vai além. O Oriente é capaz de ver as
coisas com olhos que vão além, não gostaria de usar a palavra ‘transcendental’
porque alguns religiosos orientais não acenam à transcendência, mas a uma visão
além do limite da imanência, sem porém dizer transcendência. Por isso uso
expressões como poesia, gratuidade, a busca da própria perfeição no jejum, nas
penitências, na leitura da sabedoria dos sábios orientais. Creio que fará bem a
nós ocidentais parar um pouco e dar tempo à sabedoria.
Nagasaki e Hiroshima ambas sofreram a
bomba atômica, e isso as faz assemelhar-se. Mas há uma diferença. Nagasaki não
teve somente a bomba, mas também os cristãos. Nagasaki tem raízes cristãs, o
cristianismo é antigo, havia perseguição aos cristãos em todo o Japão, mas em
Nagasaki foi muito forte. O secretário da Nunciatura me presenteou um fac-símile
em madeira onde está escrito o “wanted” daquele tempo: procuram-se cristãos! Se
você encontrar um, o denuncie e será bem compensado, se encontrar um sacerdote,
o denuncie e será bem compensado. Isso impressiona, foram séculos de
perseguições, esse é um fenômeno cristão que de certo modo ‘relativiza’, no
sentido bom da palavra, a bomba atômica. Ao invés, ir a Hiroshima é somente
para (recordar, ndr) a bomba atômica, porque não é uma cidade
cristã como Nagasaki. Por isso eu quis ir a ambas, em ambas houve o desastre
atômico. Hiroshima foi uma verdadeira catequese humana sobre a crueldade, não
pude ver o museu de Hiroshima por motivos de tempo, porque foi um dia difícil
(devido ao ritmo intenso, ndr), mas dizem que é terrível: cartas
dos Chefes de estado, dos generais que explicavam como se podia fazer um
desastre maior. Para mim foi uma experiência muito mais comovente. E ali
reiterei que o uso das armas nucleares é imoral, por isso deve ser introduzido
no Catecismo da Igreja Católica, e não somente o uso, mas também a posse,
porque um acidente, ou a loucura de algum governante, a loucura de um pode
destruir a humanidade. Pensemos naquele dito de Einstein: ‘A quarta guerra
mundial será combatida com paus e pedras’.”
Shinichi Kawarada, The Asahi Shimbum
Como o senhor justamente indicou, não
se faz uma paz duradoura sem um desarmamento. O Japão é um país que goza da
proteção nuclear dos EUA, e é também produtor de energia nuclear, o que
comporta um grande risco como aconteceu em Fukushima. Como o Japão pode contribuir
para a paz mundial? As centrais nucleares deveriam ser desativadas?
“Volto a falar sobre a posse de
indústrias nucleares. Sempre pode acontecer um acidente, o tríplice desastre (o
terremoto, o tsunami e o desastre nuclear da central de Fukushima em 2011, ndr),
vocês o experimentaram. O nuclear é o limite, devemos abandonar as armas porque
elas são destruição. O uso do nuclear está muito no limite porque ainda não
alcançamos uma segurança total. Você poderia me dizer que também com a energia
elétrica se pode provocar um desastre por uma insegurança, mas seria um pequeno
desastre. O desastre de uma central nuclear será um grande desastre. E a
segurança ainda não foi elaborada. É uma opinião pessoal, eu não usaria a
energia nuclear enquanto não houver uma segurança total sobre sua utilização.
Alguns dizem que é um risco para a custódia da criação e que a energia nuclear
deve ser suspensa. Eu me detenho sobre a segurança. Não há asseguração para
garantir a impossibilidade de um acidente. Sim, um a cada dez anos no mundo.
Além disso há a criação, o desastre da potência nuclear sobre a criação, sobre
a pessoa. Houve o acidente na Ucrânia, (em Chernobyl, 1986, ndr).
Devemos pesquisar sobre a segurança, quer para evitar acidentes, quer para as
consequências sobre o ambiente. Sobre o ambiente creio que fomos além do
limite, na agricultura com os pesticidas, na criação de frangos com os médicos
que orientam as mães a não dar às crianças para comer aqueles frangos de
criação porque são criados com os hormônios e fazem mal à saúde. Muitas doenças
raras que hoje existem devido ao mau uso do ambiente. A custódia do ambiente é
uma coisa que ou se faz hoje ou nunca mais. Mas voltando à energia nuclear:
construção, segurança e custódia da criação.”
Elisabeth Zunica , Kyoto News
Akamada Iwao é um japonês condenado à
morte, à espera da revisão do processo. Estava presente na missa na Tóquio
Dome, mas não teve como falar com o senhor. Estava programado um breve encontro
com o senhor? O tema da pena de morte é muito discutido no Japão. Pouco antes
da reforma do Catecismo sobre este tema foram executadas treze condenações à
morte. Em seus discursos não há uma referência a essa questão. O senhor falou
sobre isso com o premier Shinto Abe?
“Sobre aquele caso de pena de morte,
eu fiquei sabendo depois, não sabia daquela pessoa. Falei com o
primeiro-ministro sobre muitos problemas, sobre processos, condenações eternas
que jamais acabam, quer com a morte, quer sem ela. Mas falei de problemas
gerais, que existem também em outros países: os cárceres superlotados, as
pessoas que aguardam com uma prisão preventiva sem presunção de inocência.
Quinze dias atrás fiz um pronunciamento para o Simpósio Internacional de
Direito Penal e falei sobre esse tema. Não se pode utilizar a pena de morte, não
é moral. Isso deve ser unido a uma consciência que se desenvolve. Por exemplo,
alguns países não podem aboli-la por problemas políticos, mas fazem uma
suspensão que é um modo de dar a prisão perpétua sem declará-la. Mas a
condenação deve ser sempre para a reinserção, uma condenação sem janelas de
horizonte não é humana. Também para a prisão perpétua se deve pensar sobre como
o condenado possa se reinserir, dentro ou fora. O senhor me dirá: mas há
condenados por um problema de loucura, doença, incorrigibilidade genética...
Então é preciso buscar o modo a fim de que desempenhem atividades que lhes
façam sentir-se pessoas. Em muitas partes do mundo os cárceres estão
superlotados, são depósitos de carne humana, que ao invés de crescer de modo
salutar muitas vezes se corrompe. Devemos lutar contra a pena de morte lenta.
Existem casos que me dão alegria porque há países que dizem: nós paramos por
aqui. Um governador de um Estado no ano passado, antes de deixar o encargo, fez
a suspensão quase definitiva: são passos de uma consciência humana. Mas alguns
países ainda não conseguiram incorporar-se nessa linha de humanidade.”
Jean-Marie Guénois, Le Figaro
O senhor disse que a paz verdadeira
pode ser somente desarmada, mas o que acontece com a legítima defesa, quando um
país é atacado por outro? Existe ainda a possibilidade de uma guerra justa?
Ainda está em projeto uma encíclica sobre a não-violência?
“Um projeto, o próximo Papa o fará...
Há projetos que estão na gaveta. Um sobre a paz está lá, está amadurecendo.
Sinto que quando for o momento o farei. Por exemplo, o problema do bullyng é um
problema de violência, falei sobre isso aos jovens japoneses. É um problema que
estamos buscando resolver com muitos programas educacionais. É um problema de
violência. Uma encíclica sobre a não-violência ainda não a vejo amadurecida,
devo rezar muito e devo buscar o caminho. Há aquele dito romano: Si vis
pacem para bellum. Aí não fomos maduros, as organizações internacionais não
conseguem, as Nações Unidas não conseguem, fazem muitas mediações meritórias,
país como a Noruega sempre está disposto a mediar, me apraz, mas é pouco, é
preciso fazer ainda mais. Pense no Conselho de Segurança da ONU, se há um
problema com as armas e todos estão de acordo para resolver aquele problema para
evitar um incidente bélico, todos votam sim, um com direito de veto vota não e
tudo se bloqueia. Não sei julgar se é bom ou não, é uma opinião que ouvi, mas
talvez as Nações Unidas deveriam dar um passo avante renunciado no Conselho de
Segurança ao direito de veto que algumas nações têm. Ouvi isso como uma
possibilidade. No equilíbrio mundial há temas que neste momento não sou capaz
de julgar. Porém, tudo aquilo que se pode fazer para deter a produção das
armas, para favorecer a negociação, com a ajuda dos facilitadores, isso se deve
fazer sempre, e dá resultados. Por exemplo, no caso da Ucrânia-Rússia, não se
fala de armas, houve a negociação para a troca de prisioneiros, isso é
positivo. No Donbass se pensa numa planificação de um regime governamental diferente,
estão discutindo sobre isso. Esse é um passo positivo. Uma coisa feia é a
hipocrisia ‘armamentista’. Países cristãos, países europeus que falam de paz e
vivem das armas, isso é hipocrisia, uma palavra evangélica, Jesus fala sobre
isso no capítulo 23 de Mateus: é preciso acabar com essa hipocrisia. É preciso
a coragem de dizer: ‘Não posso falar de paz, porque a minha economia lucra
muito com as armas’. São todas coisas sobre as quais se falar como irmãos, em
prol da fraternidade humana, sem insultar e sem macular esse ou aquele país:
paremos rapaziada, porque a coisa não é boa. Num porto chegou de um país uma
embarcação que deveria passar as armas a outra embarcação para ir para o Iêmen,
e os trabalhadores do porto disseram ‘não’. Fizeram bem e a embarcação voltou
para seu lugar de partida. É um caso, mas nos ensina como se deve seguir nessa
direção. Hoje a paz é muito frágil, mas não se deve desencorajar-se. A hipótese
da legítima defesa permanece sempre, mesmo na teologia moral é contemplada, mas
como último recurso. Último recurso às armas. A legítima defesa deve ser feita
com a diplomacia, com as mediações. Ultimo recurso: legítima defesa com as
armas. Mas ressalto: último recurso! Nós seguimos avante num progresso ético
que me agrada, ao colocar em questão toda essas coisas. Isso é bonito porque
diz que a humanidade segue adiante com o bem, não somente com o mal.”
Cristiana Caricato, TV 2000
As pessoas leem nos jornais que a
Santa Sé comprou imóveis que custaram milhões no centro de Londres e fica um
pouco espantada com esse uso das finanças do Vaticano, em particular quando
está envolvido o Óbolo de São Pedro. O senhor sabia dessas transações
financeiras e, sobretudo, na sua opinião, o uso do Óbolo está correto? O senhor
disse várias vezes que não se deve ganhar dinheiro com dinheiro, denunciou o
uso sem escrúpulo das finanças, mas depois vemos que essas operações também
envolvem a Santa Sé, e isso escandaliza. Como o senhor vê toda essa história?
«Obrigado. Primeiramente, a boa
administração normal: chega a soma do Óbolo de São Pedro. O que eu faço, coloco
na gaveta? Não, isso é má administração! Procuro fazer um investimento e quando
preciso doar, quando há necessidade, em um ano, pega-se (o dinheiro, ndr) e
esse capital não se desvaloriza, se mantém ou cresce um pouco. Esta é uma boa
administração. A administração da gaveta é má. Mas é preciso buscar uma boa
administração, um bom investimento. Está claro? Um investimento como dizemos,
“das viúvas”, como fazem as viúvas: dois ovos aqui, três ali, cinco acolá. Se
um cai, há outro, não se arruína. Sempre seguro e moral. Se você faz um
investimento do Óbolo de São Pedro na fábrica de armamentos, o Óbolo não será
Óbolo ali. Se você faz um investimento e durante anos não mexe no capital, não
é bom. O Óbolo de São Pedro deve ser gasto em um ano, um ano e meio, até que
chegue a outra coleta que se faz mundialmente. Isso é boa administração: com
segurança. Pode-se comprar também uma propriedade, alugá-la e depois vendê-la,
mas com segurança, com todas as seguranças para o bem das pessoas do Óbolo.
Depois, aconteceu o que aconteceu, um escândalo: fizeram coisas que não
pareciam limpas, mas a denúncia não veio de fora. A reforma da metodologia
econômica que começou com Bento XVI foi adiante e foi o Revisor das contas
internas quem disse: aqui há algo ruim, aqui tem coisa que não funciona. Veio
até mim e eu lhe disse: O senhor está seguro? Sim. Respondeu-me. Mostrou-me e
me perguntou: O que devo fazer? Eu disse: Existe a justiça vaticana. Vai e faça
a denúncia ao Promotor de Justiça. E fiquei contente por isso porque se vê que
a administração vaticana agora tem recursos para esclarecer as coisas ruins que
aconteceram dentro, como neste caso, que se não é o caso do imóvel de Londres,
porque isso ainda não está claro, ali havia casos de corrupção. O Promotor de
Justiça estudou a questão, fez consultorias e viu que havia um desequilíbrio no
orçamento. Depois, pediu-me permissão para fazer as investigações: há um
pressuposto de corrupção e me disse que que ele tinha que fazer investigação
nesta, naquela e naquela outra repartição. Eu assinei a autorização. A
investigação foi realizada em cinco escritórios e hoje, embora exista a
suposição de inocência, existem capitais que não são bem administrados, também
com a corrupção. Acredito que em menos de um mês terão início os
interrogatórios das cinco pessoas que foram bloqueadas porque houve indícios de
corrupção. Você poderá me dizer: esses cinco são corruptos? Não, a suposição de
inocência é uma garantia, um direito humano. Mas há corrupção, se vê. Com as
investigações veremos se são culpados ou não. É uma coisa feita. Não é bonito
que isso aconteça no Vaticano. Mas foi esclarecido pelos mecanismos internos
que começam a funcionar e que o Papa Bento tinha começado a fazer. Por isso, eu
agradeço a Deus. Não agradeço a Deus porque há corrupção, mas agradeço a Ele
porque o sistema de controle vaticano funciona bem».
Philip Pullella, Reuters
Há preocupação nas últimas semanas
com aquilo que está acontecendo nas finanças do Vaticano e, na opinião de
alguns, há uma guerra interna sobre quem deve controlar o dinheiro. A maior
parte dos membros do Conselho de administração da AIF (Autoridade de Informação
Financeira, ndr) se demitiu. Egmont, que é o grupo dessas autoridades
financeiras, suspendeu o Vaticano das comunicações seguras depois do ataque de
1º de outubro. O diretor da AIF foi suspenso, como o senhor disse, e ainda não
há um revisor-geral. O que o senhor pode fazer ou dizer para garantir à
comunidade financeira internacional e aos fiéis chamados a contribuir ao Óbolo
que o Vaticano não voltará a ser considerado um paria a ser
excluído, do qual não confiar, e que as reformas continuarão e que não se
voltará aos hábitos do passado?
«O Vaticano fez progressos na sua
administração: por exemplo, o IOR hoje é aceito por todos os bancos e pode agir
como os bancos italianos, algo que um ano atrás não existia, houve progressos.
Depois, sobre o grupo Egmont: é algo não oficial internacional, é um grupo de
membros da AIF, e o controle internacional não depende do grupo Egmont, que é
um grupo privado, mesmo que tenha o seu peso. Monyeval fará a inspeção
programada para os primeiros meses do ano próximo, será feita. O diretor da AIF
foi suspenso porque havia suspeitas de uma gestão não eficiente. O presidente
da AIF se esforçou com o grupo Egmont para recuperar a documentação
(sequestrada, ndr) e isso a justiça não pode fazê-lo. Diante disto, consultei
um magistrado italiano, importante: que devo fazer? A justiça diante de uma
acusação de corrupção é soberana num país, ninguém pode interferir lá dentro,
ninguém pode dar os papéis ao grupo Egmont. Devem ser estudados os documentos
que fazem emergir aquilo que parece uma má administração, no sentido de um
controle mal feito: parece que a AIF que não controlou os delitos dos outros. O
seu dever era controlar. Eu espero que se prove que não é assim, agora há a
presunção de inocência. Mas, no momento, o magistrado é soberano e deve estudar
como as coisas aconteceram; do contrário, um país teria uma administração
superior que prejudicaria a sua soberania. O presidente da AIF terminaria no
dia 19 (novembro, ndr), eu o chamei alguns dias antes e ele não se deu conta,
disse-me depois. E anunciei que no dia 19 ele deixava. Já encontrei o
sucessor, um magistrado de altíssimo nível jurídico e econômico nacional e
internacional, e na minha volta assumirá o cargo da presidência da AIF. Seria
um contrassenso que a autoridade de controle fosse soberana acima do Estado. É
algo não fácil de entender. O que um pouco prejudicou foi o grupo Egmont, que é
um grupo privado: ajuda muito, mas não é a autoridade de controle de Moneyval.
Moneyval estudará os números, estudará os procedimentos, estudará como agiu o
promotor de justiça e como o juiz e os juízes determinaram a coisa. Eu sei que
nesses dias começará o interrogatório de algumas das cinco pessoas que foram
suspensas. Não é fácil, mas não devemos ser ingênuos, não devemos ser escravos.
Alguém me disse, mas eu não acredito: com o fato de que tocamos o grupo Egmont,
as pessoas se assustam e está sendo feito um pouco de terrorismo (psicológico,
ndr). Vamos deixar isso de lado. Nós vamos avante com a lei, com Moneyval, com
o novo presidente da AIF. E o diretor foi suspenso: espero que seja inocente,
eu gostaria, porque é algo belo que uma pessoa seja inocente e não culpada, eu
espero. Mas foi feito um pouco de barulho com este grupo que não queria que
fossem tocados os documentos que pertenciam ao grupo.
É a primeira vez no Vaticano que a
panela é destampada a partir de dentro, não de fora. De fora tantas vezes (isso
aconteceu, ndr). Isso nos foi dito tantas vezes e nós com tanta vergonha... Mas
o Papa Bento foi sábio, começou um processo que amadureceu, amadureceu e agora
existem as instituições. Que o revisor tenha tido a coragem de fazer uma
denúncia escrita contra cinco pessoas está funcionando... Realmente, não quero
ofender o grupo Egmont, porque promove tanto bem, ajuda, mas neste caso a
soberania do Estado é a justiça, que é mais soberana que o poder executivo. Não
é fácil de entender, mas lhes peço que entendam».
Roland Juchem, CIC
Santo Padre, no voo de Bangcoc a
Tóquio, o senhor enviou um telegrama a Carrie Lam de Hong Kong. O que o senhor
acha da situação ali, com as manifestações e as eleições municipais? E quando
podemos acompanhá-lo a Pequim?
"Os telegramas são enviados a
todos os Chefes de Estado, é uma coisa automática de saudação e é também uma
forma educada de pedir permissão para sobrevoar o seu território. Isto não
significa condenação ou apoio. É uma coisa mecânica que todos os aviões fazem
quando tecnicamente entram, avisam que estão entrando, e nós o fazemos com
cortesia. Isto não tem nenhum valor no sentido da sua pergunta, tem apenas
valor de cortesia. Sobre a outra coisa que o senhor me disse: se pensamos
nisso, não é só Hong Kong. Pense no Chile, pense na França, na democrática
França: um ano de coletes amarelos. Pense na Nicarágua, pense em outros países
latino-americanos que têm problemas do gênero e também em alguns países
europeus. É uma coisa geral. O que faz a Santa Sé com isto? Apela ao diálogo, à
paz, mas não é só Hong Kong, há várias situações com problemas que não sou
capaz de avaliar neste momento. Eu respeito a paz e peço paz para todos estes
países que têm problemas, incluindo a Espanha. Convém relativizar as coisas e
apelar ao diálogo, à paz, para que se resolvam os problemas. E finalmente: Eu
gostaria de ir a Pequim, eu amo a China".
Valentina Alazraki, Televisa
Papa Francisco, a América Latina está
em chamas. Vimos depois da Venezuela e do Chile imagens que não pensávamos ver
depois de Pinochet. Vimos a situação na Bolívia, na Nicarágua ou em outros
países: revoltas, violência nas ruas, mortes, feridos, igrejas até queimadas,
violadas. Qual é a sua análise do que está ocorrendo nestes países? A Igreja e
os senhor, pessoalmente, como Papa latino-americano, estão fazendo alguma
coisa?
"Alguém me disse isto: é preciso
fazer uma análise. A situação hoje na América Latina se parece com a de
1974-1980, no Chile, Argentina, Uruguai, Brasil, Paraguai com Strössner, e
creio também Bolívia... eles tinham a Operação Condor naquele momento... Uma
situação em chamas, mas eu não sei se é um problema que se parece ou é outro.
Realmente neste momento eu não sou capaz de fazer a análise disso. É verdade
que não existem precisamente declarações de paz. O que está ocorrendo no Chile
assusta-me, porque o Chile está saindo de um problema de abusos que causou
tanto sofrimento e agora um problema deste tipo que não compreendemos bem. Mas
está em chamas, como a senhora disse, e temos de procurar o diálogo e também a
análise. Ainda não encontrei uma análise bem feita da situação na América
Latina e também há governos fracos, muito fracos, que não conseguiram colocar
ordem e paz, e é por isso que chegamos a essa situação".
Valentina Alazraki, Televisa
Evo Morales pediu a sua mediação, por
exemplo. Coisas concretas...
"Sim, coisas concretas. A
Venezuela pediu mediação e a Santa Sé sempre se mostrou disponível. Há uma boa
relação, realmente uma boa relação, estamos lá presentes para ajudar quando é
necessário. A Bolívia fez algo assim e fez um pedido às Nações Unidas que
enviaram delegados, e até também alguém das nações europeias. Não sei se o
Chile fez algum pedido de mediação internacional, o Brasil certamente não, mas
ali também há problemas. É um pouco estranho, mas não quero dizer uma palavra a
mais porque sou incompetente e não estudei bem e sinceramente não entendo bem.
Aproveito a sua pergunta para
acrescentar que vocês falaram pouco sobre a Tailândia, que é algo diferente do
Japão, uma cultura de transcendência, uma cultura também de beleza diferente da
beleza do Japão: uma cultura, tanta pobreza e tantas riquezas espirituais. Mas
há também um problema que faz mal ao nossos corações que nos faz pensar na
"Grécia e nos outros", a senhora é mestra neste problema da exploração,
estudou-o bem, e o seu livro fez tanto bem. E na Tailândia, alguns lugares na
Tailândia são difíceis por isso. Mas há a Tailândia do sul, e há também a bela
Tailândia do norte, onde eu não pude ir, que é tribal e tem toda uma outra
cultura. Recebi cerca de vinte pessoas daquela região, primeiros cristãos,
primeiros batizados, que vieram a Roma, com outra cultura, diferente, as
culturas tribais. E Bangcoc, como vimos, é uma cidade forte, muito moderna, mas
tem problemas diferentes dos do Japão e tem riquezas diferentes das do Japão.
Sobre o problema da exploração, eu quis sublinhá-lo para agradecê-la pelo seu
livro, assim como gostaria também de agradecer o livro "verde" de
Franca Giansoldati: duas mulheres que estão no avião e que fizeram um livro; cada
uma aborda os problemas de hoje; o problema ecológico e o problema da
destruição da mãe terra, do meio ambiente, e o problema da exploração humana
que a senhora tocou. Podemos ver que as mulheres trabalham mais do que os
homens e são capazes. Obrigado a vocês duas, por esta contribuição. E não me
esqueço da camisa de Rocio (a referência é à camisa de uma mexicana
assassinada, que Valentina Alzraki doou ao Papa durante uma entrevista em vídeo
nos meses passados, ndr). E obrigado pelas perguntas diretas, isso faz bem.
Rezem por mim. Tenham um bom almoço".
(Transcrição não oficial, texto
realizado por Alessandro Guarasci e Andrea Tornielli)
Fonte: Vatican News
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