O arcebispo de
Galveston-Houston, cardeal Daniel N. DiNardo, fala sobre a demissão do estado
clerical do ex-cardeal estadunidense McCarrick. "Nenhum bispo, por mais
influente que seja, está acima da lei da Igreja", disse ele.
Cidade do Vaticano -
Sergio Centofanti
“O anúncio da Santa Sé em
relação a Theodore McCarrick é um sinal claro de que os abusos não serão
tolerados. Nenhum bispo, por mais influente que seja, está acima da lei da Igreja.”
É o que afirma numa
declaração o arcebispo de Galveston-Houston, cardeal Daniel N. DiNardo,
presidente da Conferência Episcopal dos Estados Unidos, após o comunicado da
Congregação para a Doutrina da Fé, divulgado no último sábado (16/02), noticiando
a demissão do estado clerical do ex-cardeal estadunidense McCarrick.
“Por todos aqueles
abusados por McCarrick, rezo para que este julgamento possa ser um pequeno
passo, dentre muitos, rumo à cura. Em relação a nós bispos, essa decisão
reforça a nossa determinação de nos considerar responsáveis pelo Evangelho de
Jesus Cristo. Sou grato ao Papa pela determinação com a qual ele guiou a
resposta da Igreja.”
O purpurado conclui com um
convite: “Se você sofreu abuso sexual por parte de alguém dentro da Igreja
católica, peço-lhe para contatar a Polícia local e sua diocese ou eparquia
local. Os coordenadores de assistência às vítimas estão à disposição para
ajudar. Estamos comprometidos com a cura e reconciliação.”
Testemunho de James Grein, vítima de McCarrick
James Grein é uma vítima
de McCarrick. Foi abusado quando tinha 11 anos. Levou o seu testemunho durante
a investigação canônica contra o ex-cardeal estadunidense.
“Estou feliz que o Papa
tenha acreditado em mim”, afirmou numa declaração, “não obstante nada possa
restituir-me a minha infância”, mas “estou confiante de passar pela minha raiva
pela última vez. Espero que o cardeal McCarrick não seja mais capaz de usar o
poder da Igreja de Jesus para manipular as famílias e abusar sexualmente das
crianças”. “Não existe vencedores”, prosseguiu, mas “esta grande histórica e
santa situação está aliviando todos os católicos e as vítimas de abuso no mundo
inteiro. Chegou a hora para nós de limpar a Igreja. A obra de Nossa Senhora
está em andamento. McCarrick obcecou a Igreja nos últimos 50 anos. Uma Igreja
que se isolou de Jesus, dirigida por homens que escolheram adorar o dinheiro, o
poder e a ganância. Exatamente o oposto do Santo Ensinamento de Deus. Isso deve
mudar. É a Igreja de Jesus, quero voltar”. James Grein agradece a sua família:
“Sem a sua fé e orientação eu estaria em outro lugar”. E conclui: “Mais uma
vez, é a Igreja de Jesus, quero voltar. Levante-se para Jesus e caminha comigo.
Jesus é meu salvador”.
Arquidiocese de Washington: que este evento ajude o processo
de cura
A Arquidiocese de
Washington, guiada por McCarrick do ano 2000 a 2006, publicou em seu site uma
declaração: “A imposição ao ex-arcebispo Theodore E. McCarrick da pena de
demissão do estado clerical, proibindo-lhe qualquer tipo de ministério
sacerdotal, mostra a gravidade de suas ações. A nossa esperança e a nossa
oração”, prossegue a declaração, “é de que esta decisão sirva para ajudar o
processo de cura dos sobreviventes de abusos, assim como daqueles que
experimentaram decepção ou desilusão por causa do que fez o ex-arcebispo
McCarrick. Rezemos também a fim de que a Igreja seja guiada a progredir em sua
missão”. “A lei da Igreja”, conclui a nota breve, “indica que quem perdeu o
estado clerical não pode desempenhar de nenhuma forma o papel de bispo,
sacerdote ou diácono. Não pode celebrar os sacramentos, nem usar hábitos
clericais ou ser chamado com o seu título precedente”. Atualmente, recorda
enfim a declaração, o ex-cardeal “está conduzindo uma vida de oração e
penitência numa casa religiosa”.
Cardeal O'Malley: reforçar a responsabilidade dos bispos e
envolver os leigos
O arcebispo de Boston,
cardeal Seán P. O'Malley, presidente da Pontifícia Comissão para a Tutela de
Menores, sublinha a importância dessa decisão, mesmo que “não possa, por si só,
fornecer cura às pessoas que foram gravemente feridas pelas violações
escandalosas de seu ministério”, feitas por McCarrick. Nem em si mesma “levará
à cura necessária na comunidade católica e em nossa sociedade em geral”, que
“estão justamente abaladas e indignadas com o fato de que o ex-arcebispo tenha
por muito tempo conseguido infligir danos a menores e jovens adultos
vulneráveis”.
“Como líder da Igreja,
como cardeais e bispos”, prossegue O’Malley, “somos justamente julgados por
nossas ações e não por nossas palavras. As acusações sinceras e os pedidos de
perdão devem fazer parte do processo de cura, mas sozinhos ressoam vazios à luz
das revelações de abusos sexuais por parte do clero que emergiram durante o ano
passado e quase vinte anos antes. A liderança na Igreja deve reforçar a
responsabilidade (accountability) dos cardeais e bispos” e “envolver os leigos
na obra de mudança tangível na Igreja”.
Pe. Lombardi: proceder na verdade contra toda forma de
engano e mentira
“A notícia do decreto de
demissão do estado clerical do ex-cardeal McCarrick é naturalmente uma notícia
muito triste, porque é a confirmação pública e definitiva da parte da Igreja de
que essa pessoa perpetrou atos muito graves e indignos de seu serviço espiritual.
Ao mesmo tempo, nas vésperas de um encontro importantíssimo sobre o tema da
proteção dos menores e da luta contra toda forma de abuso sexual, começando
pela Igreja e seus responsáveis, é um sinal extremamente forte da vontade de
clareza e decisão, sem descontos e acordos com ninguém”.
Foi o que disse ao Tg1,
telejornal italiano, o pe. Federico Lombardi que de 21 a 24 de fevereiro será
moderador do encontro, no Vaticano, sobre “A proteção dos menores na Igreja”.
“O espírito em que nos preparamos para o encontro é claro: na Igreja é preciso
assumir as próprias responsabilidades para a proteção dos menores, prestar
conta da maneira como esta responsabilidade é exercida, a fim de proceder na
verdade e rejeitar toda forma de engano, mentira, abuso de poder, de
consciência e sexual”.
Carta do Papa aos bispos dos EUA
A Igreja nos Estados
Unidos está muito abalada com o escândalo dos abusos. Os bispos participaram de
um retiro espiritual em janeiro passado, a convite do Papa Francisco. Um retiro
guiado pelo pregador pontifício frei Raniero Cantalamessa a fim de receber de
Deus a força para enfrentar os desafios difíceis deste momento.
Na ocasião, o Papa
escreveu uma carta intensa aos bispos estadunidenses, sublinhando que a ferida
na credibilidade não se resolve somente numa lógica de organização, mas com a
conversão: a credibilidade não se arraigará “em nós mesmos” ou “em nossos
méritos” ou “em nossa honra”, mas “será o fruto de um corpo unido que,
reconhecendo-se pecador, é capaz de proclamar a necessidade de conversão”,
porque não se anuncia si mesmo, mas Jesus e assim se testemunha que, nos
momentos mais escuros, o Senhor abre caminhos e “unge a fé desencorajada, a
esperança ferida e a caridade adormecida”.
“Não podemos nos permitir,
em meio à tormenta”, observava ainda o Papa, “perder a fé na força silenciosa,
cotidiana e operante do Espírito Santo no coração dos homens e da história”. A
credibilidade nasce da confiança que, por sua vez, nasce do serviço sincero e
cotidiano a todos: um serviço que “não pretende ser de marketing ou estratégico
para recuperar o lugar perdido ou o vão reconhecimento no tecido social”, mas
pertence à própria substância do Evangelho.
Questão dos abusos no centro da plenária dos bispos
estadunidenses
Em novembro de 2018,
realizou-se, em Baltimore, a plenária da Conferência Episcopal dos EUA que teve
no centro dos trabalhos a questão dos abusos sexual cometidos por expoentes da
Igreja. Na conclusão da assembleia, o presidente dos bispos, o cardeal Daniel
DiNardo, arcebispo de Galveston-Houston, sublinhou que a esperança da renovação
“é primeiramente fundamentada em Cristo, que deseja que a Igreja seja
purificada e que os nossos esforços deem fruto”.
O purpurado expressou
novamente ao Papa, em nome de todos os bispos, “amor, obediência e lealdade”,
dizendo-se “seguro” de que, sob sua guia, o encontro que a Igreja universal
terá de 21 a 24 de fevereiro, no Vaticano, “ajudará a desarraigar de nossa
Igreja o mal do abuso sexual. Tornará os nossos esforços locais mais globais e
a perspectiva global nos ajudará nesse sentido”.
O cardeal DiNardo recordou
os três objetivos estabelecidos no verão de 2018: fazer o possível para chegar
ao fundo do caso McCarrick, tornar mais fácil a denúncia de abuso e má conduta
por parte dos bispos, desenvolver maneiras para estabelecer a responsabilidade
dos bispos, que sejam realmente independentes, devidamente autorizados e com um
envolvimento substancial dos leigos.
“Agora, estamos no caminho
certo para alcançar esses objetivos”, comprometidos “em tomar as medidas mais
fortes possíveis no mais breve tempo possível. Faremos isso em comunhão com a
Igreja universal. Ir adiante junto com a Igreja no mundo inteiro tornará a
Igreja nos Estados Unidos mais forte e fortalecerá a Igreja inteira.”
Fonte: Vatican News
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