Somente
a busca de lucro não garante mais a vida da empresa: é preciso uma formação de
valores e de uma ética amiga da pessoa. Foi o que defendeu o Papa na entrevista
publicada esta sexta-feira no jornal italiano. Francisco também fala de uma
economia que “mata”, porque o homem não está mais no centro de sua dinâmica.
Giada Aquilino - Cidade do Vaticano
A gestão da economia e das finanças,
a criação de novos trabalhos, o respeito pelo meio ambiente e a acolhida aos
migrantes passam todos por uma ética "amiga da pessoa", "forte
estímulo" para uma conversão de que "temos necessidade". É a
reflexão do Papa Francisco na entrevista concedida ao jornal italiano "Il
Sole 24 Ore", nas bancas esta sexta-feira (07/07).
Para o Pontífice, falta a consciência
de uma origem comum, de uma pertença a uma raiz comum de humanidade e de um
futuro a ser construído juntos. Esta consciência de base permitiria o
desenvolvimento de novas convicções, novos comportamentos e estilos de vida.
Uma ética amiga da pessoa tende a superar a rígida distinção entre realidades
orientadas ao lucro e aquelas marcadas por outros mecanismos, deixando um amplo
espaço para atividades que constituem e expandem o chamado setor terciário.
O ídolo que se chama dinheiro
A economia de hoje “mata”,
porque – reitera o Papa - "a pessoa não está mais no centro",
"ela obedece somente ao dinheiro", "ganhar dinheiro se
torna o objetivo primário e único". Francisco observa como são construídas
as "estruturas de pobreza, escravidão e descarte".
A centralidade atual da atividade
financeira em relação à economia real não é casual: por trás disso, existe a
escolha de alguém que pensa, equivocadamente, que o dinheiro é feito com
dinheiro. O dinheiro, aquele verdadeiro, é feito com trabalho. É o trabalho que
dá a dignidade ao homem, não o dinheiro. O desemprego que afeta vários países
europeus é a consequência de um sistema econômico que não é mais capaz de gerar
empregos, porque colocou um ídolo no centro, que se chama dinheiro.
O trabalho cria mais trabalho
Quando se pergunta como um
empreendedor pode ser um "criador" de valor para a própria empresa e
para os outros, a partir da comunidade em que ele vive e trabalha, o Papa
recorda o quanto é importante a "atenção à pessoa concreta", que
significa "dar a cada um o seu", "tirando mães e pais de
família da angústia de não poder dar um futuro e nem mesmo um presente aos
próprio filhos".
Significa saber dirigir, mas também
saber ouvir, compartilhando com humildade e confiança projetos e ideias.
Significa fazer de forma que o trabalho crie outro trabalho, a responsabilidade
cria outra responsabilidade, a esperança cria outra esperança, sobretudo para
as jovens gerações, que hoje precisam dela mais do que nunca. "Creio que
seja importante trabalhar juntos para construir o bem comum e um novo humanismo
de trabalho, promover um trabalho que respeite a dignidade da pessoa, que não
olha apenas ao lucro ou às exigências produtivas, mas promove uma vida digna
sabendo que o bem das pessoas e o bem empresa andam de mãos dadas."
Um desenvolvimento integral
A distribuição e a participação na
riqueza produzida, a inserção da empresa num território, a responsabilidade
social, o bem-estar das empresas, o tratamento salarial equitativo entre homens
e mulheres, a conjugação entre os tempos de trabalho e o tempo de vida, o
respeito do meio ambiente, o reconhecimento da importância do homem em relação
à máquina e o reconhecimento do justo salário, a capacidade de inovação são
elementos importantes que mantêm viva a dimensão comunitária de uma empresa.
"Buscar um desenvolvimento integral pede a atenção aos temas que acabei de
listar."
O agir econômico é um fato ético
Uma economia saudável – observa
portanto Francisco - "nunca está desconectada" do significado daquilo
que se produz, e o agir econômico é "sempre" também um fato ético.
Manter unidas ações e
responsabilidades, justiça e lucro, produção de riqueza e sua redistribuição,
operacionalidade e respeito ao meio ambiente tornam-se elementos que ao longo
do tempo garantem a vida da empresa.
Ainda muito trabalho para o
desenvolvimento da dimensão ecológica
Nesta ótica, o significado da empresa
"se amplia" e faz compreender que "somente a busca pelo lucro
não garante mais a vida da empresa" e que "não é mais possível que os
operadores econômicos não ouçam o clamor dos pobres".
Eis o motivo pelo qual o Papa pensa,
além de uma formação técnica na empresa, também em "uma formação aos
valores": solidariedade, ética, justiça, dignidade, sustentabilidade, para
enriquecer "o pensamento e a capacidade operacional".
Na perspectiva, depois, de um desenvolvimento da dimensão ecológica, centra-se na "convergência de várias ações: política, cultural, social, produtiva", mesmo se "o trabalho a ser feito ainda seja muito".
Na perspectiva, depois, de um desenvolvimento da dimensão ecológica, centra-se na "convergência de várias ações: política, cultural, social, produtiva", mesmo se "o trabalho a ser feito ainda seja muito".
A partilha de uma viagem comum
O Papa volta então ao clamor dos
pobres ao recordar que, quando eles se movem, "causam medo aos povos que
vivem em bem-estar". Francisco observa que "não existe futuro
pacífico para a humanidade, senão na aceitação da diversidade, na
solidariedade, no pensar na humanidade como uma só família".
A atenção aos migrantes é "um
grande desafio para todos" hoje: a viagem que realizam – destaca - no
fundo "é feita a dois" e não devemos ter medo de compartilhá-la, com
esperança.
"Aqueles que vêm à nossa terra,
e nós que vamos ao coração deles para compreendê-los, entender a sua cultura, a
sua língua, sem negligenciar o contexto atual. Isto seria um sinal claro de um
mundo e de uma Igreja que procura ser aberta, inclusiva e acolhedora, uma
Igreja mãe que abraça a todos na partilha da viagem comum."
Dignidade do trabalho e sociedades
justas e democráticas
Interpelado sobre os consensos
obtidos na Itália por forças políticas definidas como populistas, que não
compartilham a abertura das fronteiras nacionais aos migrantes, e sobre as
direções a serem dadas à Europa, o Pontífice exorta a olhar para as pessoas que
fogem da miséria e da fome, solicitando "muitos empresários" e outras
tantas "instituições européias às quais não faltam genialidade e
coragem", para "empreender caminhos de investimento, em seus países,
em formação, desde a escola até o desenvolvimento de verdadeiros sistemas
culturais reais e sobretudo no trabalho", apontando para o bem dos Estados
"ainda hoje pobres", "dando a essas pessoas a dignidade do
trabalho e ao seu país a capacidade de criar laços sociais positivos, capazes
de construir sociedades justas e democráticas".
"As respostas aos pedidos de
ajuda, mesmo que generosas, podem não ter sido suficientes e oje choramos
milhares de mortos. Houve muitos silêncios. O silêncio do senso comum, o
silêncio do sim é feito sempre assim, o silêncio do nós sempre contraposto ao
eles. O Senhor promete descanso e libertação a todos os oprimidos do mundo, mas
Ele tem necessidade de nós para tornar eficaz a sua promessa. Tem necessidade
de nossos olhos para ver as necessidades dos irmãos e irmãs. Tem necessidade de
nossas mãos para socorrer. Tem necessidade da nossa voz para denunciar as
injustiças cometidas no silêncio, às vezes cúmplice, de muitas. Sobretudo, o
Senhor tem necessidade do nosso coração para manifestar o amor misericordioso
de Deus pelos últimos, os rejeitados, os abandonados, os marginalizados."
Integração e instalação digna
Por parte dos migrantes – acrescenta
–, é necessário o respeito pela cultura e pelas leis do país que os acolhe,
"para colocar assim em campo conjuntamente um percurso de integração e
para superar todos os medos e inquietações".
Confio
estas responsabilidades à prudência dos governos, para que encontrem
modalidades compartilhadas para dar acolhida digna a tantos irmãos e irmãs que
pedem ajuda. Pode-se receber um certo número de pessoas, sem negligenciar a
possibilidade de integrá-las e organizá-las de maneira digna. É necessário ter
atenção aos tráficos ilícitos, cientes de que a acolhida não é fácil.
Fonte: Vatican News
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