sexta-feira, 15 de janeiro de 2016

EDITORIAL DO DIRETORE DO "L'OSSERVATORE ROMANO": AINDA JUNTOS, DE NOVO A CAMINHO


Numa época mediaticamente obcecada pelas as primeiras vezes (que frequentemente nunca são primeiras), que interesse e que sentido pode ter a visita do Papa Francisco à comunidade judaica de Roma? Não é difícil responder que precisamente o hábito dos encontros entre o pontífice, chefe visível da igreja católica, com os membros ou com a comunidade do judaísmo mundial, que já se multiplicaram nos últimos anos, torna este encontro, depois daqueles dos seus predecessores, não menos significativo, ao contrário ainda mais relevante para o crescimento irreversível do conhecimento recíproco (na realidade, ainda escasso) e da amizade.
Para a visita, assim como aconteceu com Bento XVI, foi escolhido o dia em que na Itália se celebra o diálogo entre católicos e judeus, estabelecido não por acaso na vigília da semana de oração pela unidade dos cristãos. De forma análoga, o organismo da Santa Sé delegado para as relações com o judaísmo está inserido naquele instituído para favorecer a união entre as confissões cristãos entre si separadas. De modo a expressar uma realidade antiga e da qual se está a tomar cada vez mais consciência, ou seja, que a primeira dolorosa separação foi precisamente entre sinagoga e igreja.
Separação que levou a uma história complicada, cheia de incompreensões, inimizades, desprezo, violências, perseguições, mas também de proximidade e relações fecundas. Através de vicissitudes, dialécticas e tensões fortíssimas, embora estas nunca levaram judeus e cristãos a interromper uma ligação que não pode ser cortada e cujo significado será revelado só no final dos tempos. Menos de trinta anos depois da suplício na cruz e da ressurreição de Jesus, o mestre de Nazaré, já Paulo tinha intuído esta história misteriosa quando ditou a sua carta à comunidade cristã de Roma, de origem obviamente judaica e que ainda não conhecia.
Na idade moderna e na contemporânea, novas perseguições, a assimilação nalguns países europeus, judaicofobias, anti-judaísmo e anti-semitismos diversos entrelaçam-se até ao amadurecer e ao desencadear do mal radical no shoah, com o extermínio de seis milhões de judeus no velho continente. A tragédia, quase indizível pelo seu horror, leva de facto a uma aproximação e vontade de compreensão novas entre cristãos e judeus. Até às intuições de João XXIII e sobretudo à determinação de Paulo VI, que com paciência faz com que o concílio vote quase por unanimidade uma declaração abertamente positiva sobre religiões não cristãs, e em particular sobre o judaísmo.
A visita do primeiro bispo de Roma que veio da América à mais antiga comunidade da diáspora judaica ocorre precisamente cinquenta anos depois da aprovação do texto conciliar. Por razões de idade Bergoglio é também o primeiro Papa a não ter participado no Vaticano II, mas é filho do concílio que mudou o rosto da igreja católica, vem de um país, a Argentina, onde está enraizada uma forte minoria judaica, e como bispo tem como bagagem de experiência uma história de tradição e de amizade com diversos membros do judaísmo.
Nos decenios sucessivos ao Vaticano II as relações de conhecimento, amizade e colaboração entre muitíssimos católicos e judeus intensificaram-se a ponto não só de equilibrar, mas até de transcender resistências e oposições que, contudo, se encontram, ainda tenazes, em ambas as partes. Ao contrário, é mais difícil superar a indiferença, a ignorância e a desconfiança recíprocas. A este propósito deve ser recordado antes de tudo um homem por quanto fez a favor da proximidade entre as duas comunidades, isto é, Elio Toaff, durante meio século rabino-chefe de Roma, recordado por João Paulo II no seu testamento dominado de forma singular por uma visão mística da história.
Por conseguinte, Francisco chega ao Templo Maior de Roma acompanhado por uma história longuíssima e que nas últimas semanas foi marcada por dois documentos muito importantes: uma declaração, tão breve quanto importante, de vinte e cinco rabinos ortodoxos, em grande parte israelitas e norte-americanos, por um lado, sobre o significado e o valor do cristianismo, e por outro um longo documento da comissão da Santa Sé para as relações com o judaísmo acerca da irrevogabilidade dos dons de Deus ao povo da primeira aliança. Textos que constituem um reconhecimento recíproco exigente, na afirmação explícita que a vocação de judeus e de cristãos é una e indivisível: uma passo em frente que não é arriscado definir de alcance histórico.
Fonte:  L’Osservatore Romano
g.m.v.

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