Por Michaela Koller
Roma (ZENIT.org) - O lançamento do livro-entrevista do Papa Bento XVI, "Luz do mundo", recebeu hoje uma enorme acolhida mundial. A demanda tão extraordinária deste livro do jornalista alemão Peter Seewald levou a editora alemã Herder a dobrar o número de exemplares nesta primeira semana.
Inúmeros comunicadores de diversas partes do mundo estavam se preparando para o grande impacto das respostas do Pontífice. Falava-se da força explosiva dos conteúdos, inclusive de uma revolução espiritual.
Mas as respostas do Papa, apresentadas nestas 240 páginas, não têm, à primeira vista, nenhum conteúdo revolucionário. A mensagem de Bento XVI, recolhida na intimidade de diálogos pessoais com Seewald, destaca-se de forma extraordinária porque é Evangelho atualizado, Boa Nova de hoje.
Bento XVI se apresenta, nessas linhas, a partir de um prisma pessoal, tornando transparentes suas mudanças de perspectiva ao concretizar sua fé na história. É uma mensagem atualizada a partir da realidade de mudança que estamos vivendo hoje.
E então surge a pergunta chave de Peter Seewald: "Segundo o Evangelho de São João, Jesus diz, em uma passagem decisiva, que o importante é o mandato do Pai: ‘E eu sei: o que ele ordena é vida eterna'. É por isso que Jesus veio ao mundo?".
O Santo Padre responde: "Sem dúvida alguma. Disso se trata: de que cheguemos a ser capazes de Deus e, assim, possamos entrar na vida autêntica, na vida eterna. Realmente, Ele veio para que conheçamos a verdade. Para que possamos tocar Deus. Para que a porta esteja aberta para nós. Para que encontremos a vida real, a que não está submetida à morte".
O núcleo dessas conversas é a grande mensagem de Bento XVI, que convida o mundo à santidade. Isso não deve ser perdido de vista quando se vai revisando as notícias da primeira página dos diversos jornais, inclusive da imprensa sensacionalista, falando-nos de preservativos ou da opinião de Bento XVI sobre o uso da burca.
Cristo é o centro. Esse Cristo que diz aos seus apóstolos: "Vós sois a luz do mundo". A grande entrevista, assim, dá continuidade à pregação do 265º Sucessor de Pedro na Santa Sé. Além disso, vai adquirindo uma forma de imediatismo inaudito como palavra direta e espontânea. Não é uma doutrina ex cathedra, deduzida das grandes verdades, senão que induz o leitor, vai brotando de um coração íntegro e enamorado, como grande testemunho pessoal de fé e síntese de vida impressionante.
A palavra impressa desse livro deixou a voz direta de Bento XVI quase sem alterações, como garante o autor no começo. Isso oferece ao leitor a possibilidade de uma composição de lugar excepcional: pode-se imaginar que se tem o "Papa Ratzinger" face a face no sofá. Pode-se ouvir sua voz no próprio idioma, enquanto Bento XVI vai abrindo amplamente a porta do seu entendimento, do seu coração e da sua alma.
Ao leitor, vai se revelando um personagem ágil, humilde, cheio de bondade, que sabe perdoar, mas que ao mesmo tempo se apresenta muito vulnerável. Da mesma forma, o livro tem um tom tão familiar e próximo, que lembra a experiência da comunidade primitiva no começo da Igreja.
Se o pontificado anterior foi o dos grandes gestos e imagens, este pontificado é o das grandes palavras. Peter Seewald conseguiu trazer à luz este dom de Bento com um emaranhado de perguntas seletas, um entretecido de política, perguntas pessoais, pastorais e esclarecimentos teológicos.
Seewald apresenta, assim, um diálogo entre o Papa e a sociedade. Põe em jogo seu amplo conhecimento e formula perguntas de amplitude global. Dessa forma, o Pontífice se converte ao mesmo tempo em ouvinte do mundo inteiro.
O jornalista faz perguntas que revelam sua sintonia com a postura crítica de Bento XVI diante da cultura atual. Ao mesmo tempo, fiel à sua profissão de comunicador, faz perguntas que vão indagando sobre temas delicados e realidades que são para o Papa causa de profunda dor.
O livro não só redigiu um capítulo importante da história da Igreja, senão que oferece pautas para um jornalismo de qualidade, que vai elevando o nível dos padrões de trabalho a um compromisso por parte dos católicos nos meios de comunicação, cujo objetivo é transmitir uma mensagem eficaz ao mundo atual.
É uma surpresa grande e positiva ouvir Bento XVI falar do bispo Richard Williamson, da Fraternidade Sacerdotal São Pio X. Pela primeira vez, o Papa revela que ele não teria assinado o decreto sobre a revogação da excomunhão do britânico se tivesse sabido da sua negação das câmaras de gás. "Não. Então seria preciso ter separado primeiramente o caso Williamson. Mas, infelizmente, nenhum de nós havia feito uma busca na internet, para saber, assim, de quem se tratava", disse literalmente o Pontífice.
Ao assunto Williamson está vinculada a relação da Igreja Católica com os judeus e a relação com o Estado de Israel. Depois do alvoroço sobre as declarações dos padres do Sínodo do Oriente Médio sobre o conflito entre Israel e Palestina, aos "nossos pais e irmãos" chega mais uma vez uma clara confissão papal sobre o direito de existência de Israel. Isso não foi afirmado tão explicitamente pelos bispos da região, que condenaram, em seu documento final, o "antissemitismo", mas não o "antissionismo".
"Para mim, foi muito emocionante com que cordialidade me recebeu o presidente Peres, que é uma grande personalidade", conta o cabeça da Igreja Católica sobre sua visita a Israel em maio de 2009. "Ele carrega o peso de uma lembrança difícil. Como você sabe, seu pai foi preso em uma sinagoga à qual depois se ateou fogo. Mas ele veio até mim com uma grande abertura e sabendo que lutamos por valores comuns e pela paz, pela configuração do futuro e que, nisso, a questão da existência de Israel desempenha um papel importante".
O livro esclarece que não é verdade o que a mídia difundiu há algumas semanas sobre as declarações referentes à relação com o Islã: o Papa Bento não se distancia de forma alguma do discurso de Ratisbona: "A consideração política não levou em consideração o conjunto, senão que tirou um fragmento do contexto e o converteu em um ato político, que em si não era".
Ao ser perguntado pela estratégia diante dos casos de sacerdotes que vivem uma relação com uma mulher ou que formaram uma família em segredo, o Papa comenta: "Quando um sacerdote coabita com uma mulher, é preciso verificar se existe uma verdadeira vontade matrimonial e se poderiam formar um bom casal. Se for assim, eles têm de seguir esse caminho. Quando se trata de uma falta de vontade moral, mas existe um vínculo interior real, é preciso tentar encontrar caminhos de cura para ele e para ela".
O problema fundamental, confirma o Papa, "é a honradez". Além disso, existe a importância do "respeito pela verdade dessas duas pessoas e dos filhos, a fim de encontrar a solução correta".
Na entrevista, vislumbra-se também o conceito do amor de Bento, um tipo de amor que não permite separar a verdade do amor, que não deve ser confundido com um falso conceito de misericórdia.
Bento XVI confessa seu profundo horror diante dos casos de abusos em instituições católicas: "Hoje temos de aprender novamente que o amor ao pecador e ao danificado está em seu reto equilíbrio mediante um castigo ao pecador, aplicado de forma possível e adequada". Bento XVI não se preocupa em conservar a boa imagem da Igreja, senão que coloca o peso na credibilidade do testemunho daqueles que se consagraram ao seguimento de Cristo. Esta é a meta à qual o livro aponta com seu título, "Luz do mundo".
"Vós sois o sal da terra. Ora, se o sal perde seu sabor, com que se salgará? Não servirá para mais nada, senão para ser jogado fora e pisado pelas pessoas.
Vós sois a luz do mundo. Uma cidade construída sobre a montanha não fica escondida.
Não se acende uma lâmpada para colocá-la debaixo de uma caixa, mas sim no candelabro, onde ela brilha para todos os que estão em casa.
Assim também brilhe a vossa luz diante das pessoas, para que vejam as vossas boas obras e louvem o vosso Pai que está nos céus" (Mateus 5,13-16).
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