A festa religiosa teve início logo às
7h30, com uma Missa na Paróquia de São Pedro, na Avenida Beira-Mar
O andor com a imagem de São Pedro,
considerado protetor dos pescadores, deixa a Paróquia que tem o seu nome
acompanhado por uma multidão pelas ruas do Mucuripe ( Fotos: Kleber A. Gonçalves
)
Não tem jeito: todo
pescador tem devoção a São Pedro. A garantia é dada por Antônio Pereira de
Matos, que cresceu entre as ondas do Mucuripe, em Fortaleza, desde os oito dos
63 anos de vida, acompanhando os remos do avô e do pai, também pescadores.
Hoje, já adulto, ajuda a carregar nos ombros a imagem do Santo, da paróquia à
jangada, para a procissão marítima realizada tradicionalmente nos dias 29 de
junho, dia dedicado ao patrono dos pescadores.
Na capital
cearense, a festa religiosa teve início logo às 7h30, com a celebração de uma
missa cujo público nem cabia entre as paredes da Paróquia de São Pedro, na
Avenida Beira Mar. A devoção que inunda os olhos e guia cada gesto de louvor à
imagem do santo, "o primeiro chefe da Igreja", encontra origem na
empatia dos fiéis.
"Jesus viu
nele a fortaleza de um homem bom, jogando a rede ao mar. Cada um de nós tem um
Pedro dentro de si, e nos aproximamos tanto porque ele era gente como a gente.
Sempre negamos e voltamos a Jesus, e assim ele também fazia", reflete
Fernando Pontes, padre da paróquia homônima ao santo.
A admiração por
quem foi - e, para os devotos, continua sendo - Pedro se mistifica e ganha
forma na fé. "Tenho muito a agradecer a ele. Passei por muitas
tempestades, navios se aproximando do barco, ventos demais e, na hora de
voltar, ventos de menos... Se eu estou aqui, devo a Deus e a São Pedro",
reverencia o pescador Antônio Pereira, ao que sintetiza o presidente da colônia
de pescadores Z-8, Possidônio Soares: "São Pedro é, para nós, símbolo de
fé e esperança em dias melhores".
Soares ressalta
ainda a importância simbólica da procissão marítima aos que vivem no mar - e do
mar. "Manter tudo isso vivo é muito importante para o Mucuripe, porque,
depois do índio, foi o pescador o primeiro morador daqui. É uma festa
centenária, que continua ocupando nossos verdes mares", afirma, garantindo
que, antes mesmo de o percurso ser registrado, nos anos 1930, as homenagens ao
santo já aconteciam na Capital - ancorando a empolgação do pescador Dimas
Pereira, 58. "É uma alegria ver São Pedro entrando no mar com a gente,
hoje. Torço pra que isso nunca acabe", declara.
A esperança de que
a tradição se perpetue divide espaço com a preocupação latente de muitos
pescadores. Isso porque, segundo eles, a festa tem sido descaracterizada, a
começar pela quebra de uma tradição: as famílias dos pescadores não podem mais
embarcar junto aos tripulantes, devido a uma restrição da Capitania dos Portos
do Ceará.
"A gente não
impede a festa, pelo contrário, incentiva - desde que esteja tudo de acordo com
as normas, visando a segurança. É uma festa bonita, mas deve ser segura",
explica o capitão dos portos do Estado, Leonardo Salema. Em 2015, devido à
superlotação das embarcações, a procissão foi cancelada. Neste ano, porém, de
acordo com Salema, 18 barcos foram cadastrados e inspecionados para acompanhar
o percurso marítimo de São Pedro, que representa o primeiro patrimônio
histórico imaterial de Fortaleza, registrado em 2010 pelo Conselho Municipal de
Patrimônio Histórico e Cultural (Comphic).
Quadrilha infantil
"Antes, quando
o santo chegava à risca do mar, no barco, aqui na areia era feita uma quadrilha
infantil. A festa vai mudando, mas a identidade profunda resiste", avalia
uma das relatoras do registro no Comphic, Olga Paiva. Depois da missa-marco da
Festa de São Pedro, entre as centenas de fiéis sob o sol de céu limpo, Maria
dos Navegantes, 66, escorava-se num barco e acompanhava a procissão com os
olhos, analisando todas as mudanças sofridas pela celebração.
Observava tudo em
terra firme, com os pés bem fincados na mesma areia em que corria aos cinco
anos de idade, quando chegou à praia do Mucuripe. Porque o mar é lindo demais,
mas não, não tem coragem de navegá-lo. O mergulho, agora, só se dá mesmo pelas
ondas da memória - por onde ainda navega o marido pescador que perdeu para o
alto mar, num acidente entre a canoa e uma lancha, há 26 anos.
"Porque
covarde, Maria, é o pescador que morre em terra firme", ele dizia, antes
de se entregar ao mar de São Pedro que nunca o trouxe de volta".
(Colaborou Theyse Viana).
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