sexta-feira, 23 de outubro de 2009

CARTA DA 14ª ROMARIA DA TERRA

Seguindo as pegadas dos mestres Dom Hélder Câmara, Pe. Ibiapina, Pe. Cícero, Conselheiro, Zé Lourenço e na alegria da poesia do camponês Patativa do Assaré, a celebração da 14ª Romaria da Terra, em Iguatu (CE), nos convoca e motiva a lutar pela vida no semiárido, confiantes, que os povos da terra e das águas, são capazes de vencer as dificuldades com solidariedade e partilha.Nesta Romaria, renovamos nossas energias e compromisso com o Projeto do Bom Pastor, Jesus Cristo - “Vida plena para todos e todas”. O campesinato deste Bioma Caatinga descobriu, a partir das experiências de convívio com a nossa realidade geográfica, social, política e cultural, a riqueza de armazenar água através das cisternas de placa e barragens subterrâneas, canalizar água e produzir culturas diversificadas, através das mandalas, ter um outro manejo do solo por meio de práticas agroecológicas, dizendo não às queimadas e aos agrotóxicos que tanto fazem mal à terra e a todos os seres vivos.A partir destas tecnologias alternativas e de convivência com o semiárido, reafimamos que o grande problema do Nordeste não é a irregularidade de chuvas, como sempre se afirmou ser a “seca” a causadora do empobrecimento de nosso povo. Está cada vez mais claro que uns poucos sempre ganharam com a estória da seca, com a construção de barragens, açudes e outras benfeitorias em suas propriedades. Por isso, entendemos que a seca foi utilizada durante décadas para encobrir as reais causas da miséria: o coronelismo, concentração da terra e da água e consequentemente, da riqueza. Vale ressaltar que, perante o domínio dos povos oprimidos, acontecem diversas formas de resistência em defesa da vida e seus ideais. É, na fidelidade ao Deus dos pobres, a serviço dos povos da terra, que os camponeses e camponesas reforçam suas organizações como melhor caminho para combater o latifúndio que promove a exclusão de significativo número de famílias que vivem no meio rural.Os camponeses e camponesas do semiárido cearense a partir de sua fé no Deus da Vida, vão resgatando a memória das experiências de libertação, desde o povo de Israel no Egito, animados pela fé no Deus Libertador de escravos (Ex 3, 7-10), na consciência do convívio amoroso e respeitador com a obra da criação (Lv 25, 1-15). Resgatamos as experiências de liberdade, fartura e fraternidade de Palmares, dos Arraiais de Canudos na Bahia e Caldeirão no Ceará. Trazemos em nossa consciência e coração a sensibilidade e solidariedade social do Bom Pastor de Nazaré, nas atitudes testemunhais dos Beatos Conselheiro e Zé Lourenço, das Missões Populares do Padre Ibiapina, do Padre Cícero Romão, do Profeta Dom Hélder Câmara, nas mulheres cristãs Dolores Borges (Pastoral Operária) e Margarida Alves (sindicalista), e na poesia-profecia de Patativa do Assaré.Crescemos na consciência eclesial do protagonismo dos preferidos de Deus, que recuperam a sua voz, sua cidadania e constroem experiências de educação contextualizada, integrando saber popular, saber cientifico, educação política e vivência da fé, levando em conta a pessoa toda e todas as pessoas, sem exclusões ou dualismos.Lutamos por políticas públicas em que a população tenha poder de interferência e proposição e que os bens públicos sejam administrados com transparência e honestidade. Lutamos pelo limite da propriedade da terra no Brasil, como também pela demarcação das terras indígenas e de quilombolas. Lutamos contra a exploração do trabalho humano e da escravidão do trabalho. A nossa fé no Deus da vida, não nos permite silenciar diante das injustiças sociais. Por isso, nossa história está marcada pelo anúncio, denúncia e renúncia profética, como tantos que já regaram as sementes do Outro Mundo Possível com o próprio sangue: Margarida, Josimo, Ezequiel, Dorothy, Raimundo Varela, Benedito Tonho, e outros. Queremos estar vivos para bendizer e louvar ao Deus que nos criou para a felicidade com dignidade.No serviço aos povos da terra, a Comissão Pastoral da Terra (CPT) confirma o compromisso de apoiar e acompanhar: 1) A luta pela terra e resistência dos posseiros; 2) A demarcação das terras indígenas; 3) A identificação e titulação de terras quilombolas; 4) A utilização, sistematização e divulgação de experiências com tecnologia ambiental e socialmente apropriadas ao semiárido, a exemplo das cisternas, mandalas, barragens subterrâneas; 5) A promoção da cidadania, respeitando as diversidades; 6) A articulação de forças sociais para integrarem as lutas pelos direitos humanos, 7) A construção de uma nova cultura de uso dos bens da natureza, na perspectiva das populações tradicionais: amorosidade, cuidado e preservação.Compromissos estes, que possam assegurar uma sustentabilidade livre do condicionamento capitalista, para dar garantia , primeiramente, à Terra, à sociedade e às pessoas do semiárido para Viver, Produzir e Celebrar.Iguatu(CE), 11 de outubro de 2009.Comissão Pastoral da Terra - Ceará.

Fonte: Pascom da Arquidiocese de Fortaleza

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