Eis um belo artigo do professor Antônio Mourão sobre a Semana Santa que começa neste domingo de fato para todos, pois Páscoa é tempo de mudanças. Confira:
A Semana Santa traz recordações do tempo em que a presença da Igreja era bem mais intensa. O mundo parecia entrar em luto profundo. Os atos litúrgicos eram acompanhados com grande devoção. Tudo parava. O comércio. A indústria. Os serviços. As diversões. Até as emissoras de rádio faziam pausa em sua programação, tocando músicas sacras. Em casa, tudo parecia diferente: o jejum, o recolhimento, a hora de ir à igreja. A gente falava baixinho ou apenas o necessário. Na Sexta-Feira Maior, em procissão solene, a dor do Senhor morto. Será que mudamos para melhor? Claro que cada época tem suas expressões, seus ritos e ritmos. No frenesi do consumo e da velocidade que nos cercam, esquecemos o valor do recolhimento e da oração. Temos uma pressa de ir para não sei aonde. O mundo tornou-se leigo (ou agnóstico?) e estas lembranças são apenas memórias de gente que envelhece... Será que deve ser assim? Não me refiro aos rituais litúrgicos - se em Latim ou mesmo de frente para o altar - (discussão ingênua!). Ou mesmo na proposta insistente do comércio que tenta faturar, passando como necessária a compra de ovos de Páscoa. Nenhum nexo com nossa História. Pouco importa, interessa o lucro. Qual seria, hoje, o grande significado do Cristo crucificado? Qual seria a compreensão a buscar desse momento? Ele redime a dor humana pela proposta libertadora do amor. Há uma radicalidade no "gesto de amor maior não há que doar a vida ao seu irmão". Quando nos fechamos em nossos próprios interesses, meramente pessoais; quando a solidariedade chega apenas ao clã ou a nossa etnia, com certeza, ainda não nos libertamos para o amor. "Eu vim para que todos tenham vida. Vida em abundância." Pode-se perguntar: por que radicalidade? Porque, como Deus, Ele não apenas resolve assumir a condição humana, como aceita morrer para redimir nossos pecados. Parece uma coisa sem nexo, mas nela podemos encontrar a essência transcendente da vida que vai além do puramente racional. A razão não nos basta. Talvez que ainda não chegamos ao entendimento do gesto maior da Semana Santa: o Cristo que liberta. "Ele venceu a morte... pelo amor aos homens." Por isso, a Semana Santa é um momento único. Ela nos faz mais humanos.
Antonio Mourão Cavalcante - Médico e antropólogo. Professor Universitário e cristão.
Nenhum comentário:
Postar um comentário